JUSTIÇA

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quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Efeitos do Julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.334.488/SC (Desaposentação)*

Autor:
SERAU JUNIOR, Marco Aurélio


RESUMO: Na data de 08.05.2013, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça proferiu julgamento na sistemática processual, prevista no art. 543-C do Código de Processo Civil (recursos especiais repetitivos), julgando o recurso especial 1.334.488/SC, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, confirmando a tese da desaposentação, inclusive com a dispensa de restituição da primeira aposentadoria. Este trabalho expõe as primeiras observações a respeito desse importante julgamento, analisando suas consequências judiciais, administrativas e legislativas.

PALAVRAS-CHAVE: Previdência Social. Processo Civil. Desaposentação. Recurso Especial Repetitivo. Efeitos.

Introdução

O recente julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.334.488/SC é de particular relevância para a comunidade jurídica e para a sociedade brasileira.

Consagra importante tese jurídica a desaposentação, situação que afeta aproximadamente meio milhão de aposentados que voltaram ou permaneceram trabalhando.

Este trabalho apresenta as primeiras observações a esse posicionamento adotado pelo STJ.

1 O Julgamento do REsp Repetitivo 1.334.488/SC

Neste tópico cabe um breve resumo do julgamento do REsp Repetitivo 1.334.488/SC.

Julgado em 08.05.2013, sob relatoria do Ministro Herman Benjamin, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça proferiu julgamento na sistemática processual prevista no art. 543-C do Código de Processo Civil (recursos especiais repetitivos), confirmando a tese da desaposentação.

Apenas relembrando, a desaposentação consiste na prática da renúncia à aposentadoria do segurado que permaneceu ou voltou a trabalhar, buscando novo e mais vantajoso benefício a partir das novas contribuições previdenciárias vertidas aos cofres autárquicos (SERAU Jr., 2013).

Na esteira de precedentes do próprio Tribunal, à exceção da ressalva de posicionamento pessoal do relator, que destacou a importância da primazia do custeio para concessão de novos benefícios, consagrou-se também a tese da irrepetibilidade da primeira aposentadoria.

O relator, Ministro Herman Benjamin, ainda sublinhou a possibilidade de generalização de aposentadoria denominada por ele de "proporcional". Porém, esse fundamento também não foi acatado pelo restante do colegiado.

A fundamentação do acórdão segue na esteira de que as aposentadorias consistem em direitos patrimoniais e, portanto, disponíveis e renunciáveis.

Esta não é, porém, a melhor fundamentação que se pode encontrar. Conforme vimos defendendo há alguns anos, o melhor ponto de justificativa para a pretensão de desaposentação consiste no próprio caráter contributivo da Previdência Social, previsto no art. 201, caput, da Constituição Federal (SERAU Jr., 2013).

Uma vez que o sistema é essencialmente contributivo e baseado em equilíbrio financeiro e atuarial, a existência de novas contribuições previdenciárias deve repercutir positivamente para os segurados, em termos de melhoria do nível de benefícios.

Uma questão importante a ser sublinhada consiste na força vinculante desse julgamento, visto que proferido na sistemática dos recursos especiais repetitivos (SERAU Jr., REIS, 2009).

Por fim, ressalte-se que o acórdão ora analisado foi publicado no DJE de 14.05.2013 (Documento 1186178).

2 Efeitos Jurídicos do Julgamento do REsp 1.334.488/SC

O julgamento recém-proferido pelo STJ permite a visualização de diversos efeitos jurídicos, de distintas ordens: processual, administrativa e legislativa. Vamos a eles.

2.1 Consequências Judiciais

As consequências judiciais/processuais são de diversas ordens. Podemos agrupá-las em termos de repercussão nos processos novos e nos processos em curso, ainda não decididos. Para os processos ainda em tramitação judicial, pode-se subdividir as consequências aqui analisadas em relação à fase processual em que estes se encontrem: a) julgamento de primeira ou segunda instância; b) interposição de recurso especial, suspenso ou não, do segurado; c) concomitância de recurso extraordinário sobrestado; d) recurso especial do INSS.

2.1.1 Novos Processos

Os efeitos vinculantes, até mais do que a importância da consolidação da jurisprudência do STJ, do acórdão proferido no REsp 1.334.488/SC, forçam a tendência do julgamento procedente dos processos vindouros em que se venha a buscar a desaposentação.

2.1.2 Processos em Curso

A citada força vinculante do acórdão em análise impõe o julgamento de procedência dos pedidos de desaposentação, seja na primeira ou na segunda instância da Justiça (Justiça Federal, órgãos da Justiça Estadual atuando em competência delegada e Tribunal Regional Federal).

Recursos especiais que se encontrem suspensos nos Tribunais Regionais Federais em virtude da sistemática dos recursos especiais repetitivos voltarão a ser processados.

Os recursos especiais interpostos pelos segurados, posto que veiculam a tese adotada pelo STJ, retornarão aos Gabinetes dos Desembargadores Federais para adequação do julgamento, reformando-se os acórdãos contrários ao posicionamento firmado pelo STJ, qual seja, o da permissividade da desaposentação independentemente de restituição de quaisquer valores (art. 543-C, § 7º, II, do CPC).

No caso de além do recurso especial o segurado houver interposto também o recurso extraordinário, é muito provável que este se encontre sobrestado, conforme decisão do STF que atribuiu à desaposentação repercussão geral. Porém, o sobrestamento do recurso extraordinário não paralisa o processo, e o recurso especial pode receber seu regular andamento.

Conforme dicção literal do art. 543-B, § 1º, do CPC, ficam sobrestados os recursos extraordinários, não os processos onde tenham sido interpostos. O mesmo entendimento se aplica aos recursos especiais repetitivos, nos moldes do art. 543-C, § 1º, do mesmo diploma legal.

Ademais, os arts. 543-A, 543-B e 543-C, que cuidam da sistemática de gestão de recursos especiais e extraordinários repetitivos, não estabelecem relação de prejudicialidade entre recurso especial e recurso extraordinário julgados nessa modalidade de processamento. Essa relação de prejudicialidade só tem lugar no art. 543 do CPC, aplicando-se tão somente quando os recursos especial e extraordinário são efetivamente admitidos e dirigidos aos Tribunais Superiores.

Portanto, eventual recurso extraordinário sobrestado não interfere na devolução do processo aos Relatores para adequação do julgamento e compatibilização com o entendimento consagrado no STJ.

Os recursos especiais interpostos pelo INSS, que já se encontrem suspensos ou que ainda venham a ser interpostos terão necessariamente negado seu seguimento, nos termos do art. 543-C, § 7º, inciso I, do CPC. Isso porque sua postulação veicula tese manifestamente contrária àquela pacificada no âmbito do STJ.

A condição para aplicação de todas as consequências judiciais acima aventadas reside no trânsito em julgado da decisão ora comentada, conforme entendimento preconizado pela doutrina (SERAU Jr., REIS, 2012).

2.2 Consequências Administrativas e Legislativas

A força vinculante do acórdão em exame indica possível aceitação da tese da desaposentação pelo INSS, embora esse panorama ainda dependa da variável do julgamento do tema pelo STF, ainda inconcluso.

De outra parte, reforça a importância e talvez aplaine o caminho para aprovação do PLS nº 91/2010, de autoria do Senador Paulo Paim, ainda em tramitação no Congresso Nacional, no qual se assegura legislativamente a possibilidade de renúncia a benefício previdenciário, assim como a dispensa da restituição da primeira aposentadoria.

3 A Questão da Aplicação da Decadência aos Processos de Desaposentação

A aplicação de prazo decadencial para as ações revisionais de benefício previdenciário é tema que se encontra controverso nos Tribunais Superiores.

No STF o assunto da fixação de prazo decadencial, inclusive para os benefícios concedidos anteriormente à edição da Medida Provisória nº 1.523/97, é tema que teve reconhecida sua repercussão geral, ainda não tendo se pronunciado o Excelso Pretório a respeito do meritum causae. A repercussão geral foi reconhecida no RE 626.489/SE (Tema 313).

No âmbito do STJ a aplicação de prazo decadencial às revisionais de benefícios concedidos anteriormente à edição da Medida Provisória nº 1.523/97 foi admitida no REsp 1.309.529/PR, de Relatoria do Ministro Herman Benjamin, em julgamento em 28.11.2012.

Nesse julgamento, importante ressaltar, ainda não há acórdão publicado; ademais, essa decisão não transitou em julgado, pois há recurso que pende de apreciação.

O art. 103 da Lei de Benefícios faz menção expressa ao prazo final para revisão de benefícios, fixado em dez anos, verbis:

"Art. 103 - É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 10.839, de 2004)

Parágrafo único - Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)"

O pressuposto do art. 103, aqui transcrito, é a pretensão de alteração de benefício previdenciário em virtude de algum tipo de vício ou invalidade, buscando-se sua correção e adequação aos termos legais. Esse é o entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência.

A desaposentação, porém, não é pretensão de revisão, isto é, tentativa de adequar benefício previdenciário incorretamente implementado aos exatos termos da lei. A desaposentação é hipótese diversa: a busca de novo e melhor benefício previdenciário, a partir de situação fática alterada e apta a diferenciar e majorar o valor da aposentadoria.

Nesses termos, a previsão constante do art. 103 da Lei de Benefícios não se aplica à desaposentação, visto se tratar de hipótese distinta. Ademais, não pode ser aplicada mediante interpretação analógica ou extensiva.

Os institutos relativos à prescrição e decadência não podem ser interpretados analogamente, extensiva ou ampliativamente. Essa regra de prudência é o que se colhe do magistério de Carlos Maximiliano (1979, p. 234), autor de obra magistral a respeito da hermenêutica e aplicação do Direito, que assim pontifica:

"Submetem-se a exegese estrita as normas que introduzem casos especiais de prescrição, porque esta limita o gozo dos direitos. (...) Diga-se o mesmo sobre a decadência."

Nesses termos, conclui-se pela inaplicabilidade do prazo decadencial decenal para a desaposentação, tendo em vista ser uma hipótese essencialmente diversa daquela de revisão de benefício previdenciário.

Em conclusão desse tópico, ainda que o STF e o STJ entendam por admitir a tese da aplicação da prescrição decenal inclusive aos benefícios previdenciários concedidos anteriormente à sua implementação, em 1997 (o que em nossa ótica fere frontalmente as garantias de segurança jurídica e ato jurídico perfeito), esse entendimento não abrange as ações judiciais de desaposentação, nos termos acima delineados.

No campo específico dos recursos repetitivos, deve-se aplicar a técnica conhecida como distinguishing, oriunda do Direito norte-americano: o precedente gerado em relação à decadência simplesmente não se aplicará aos casos de desaposentação, ainda que essa insurgência seja aventada (prequestionada) nesses processos.

Conclusões

Como se discorreu neste breve trabalho, o julgamento do Recurso Especial 1.334.488/SC, na sistemática prevista no art. 543-C do Código de Processo Civil (recursos especiais repetitivos), operou efeitos importantes, nos âmbitos processual, administrativo e legislativo.

No campo processual, o aresto do STJ implicará maior aceitação da tese da desaposentação, em todos os graus de jurisdição. Deve ocorrer impacto na morosidade judicial, com a aceleração dos processos judiciais discutindo essa questão.

Mas, talvez o ponto forte realmente fique na aceitação da tese pelo INSS, com alteração de sua postura administrativa, inclusive ampliando as chances de alteração legislativa para incorporação da desaposentação no próprio bojo da Lei nº 8.213/91.


fonte: http://www.editoramagister.com/doutrina_25101822_EFEITOS_DO_JULGAMENTO_DO_RECURSO_ESPECIAL_REPETITIVO_1334488_SC_DESAPOSENTACAO.aspx

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