JUSTIÇA

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quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - MAJORAÇÃO - 25% DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL PREVIDENCIÁRIO DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE __________ - UF 







__________________, já cadastrado eletronicamente, vem com o devido respeito perante Vossa Excelência, por intermédio de seu procurador, propor 



AÇÃO PREVIDENCIÁRIA DE MAJORAÇÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ 


em desfavor do INSS - INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, pessoa jurídica de direito público, com natureza autárquica, representada por seus Procuradores Federais da Procuradoria Federal Especializada do INSS, com Superintendência Regional na cidade de __________, com endereço à Rua __________, pelos fundamentos fáticos e jurídicos a seguir elucidados. 

I - DOS FATOS 
O Autor, pessoa idosa, atualmente com 7_ anos, percebe o benefício de aposentadoria por invalidez nº ___.___.___-_, desde __/__/199_ (DIB), deferido em razão da incapacidade definitiva para sua atividade habitual de operador de máquinas, por apresentar limitação funcional em ambas as mãos e prejuízo da preensão, ocasionada pela moléstia artrite gotosa (CID M10.9) e sequela de fratura do 2º metacarpo da mão esquerda (CID T922). 

Recentemente, em __/__/201__, o Autor sofreu AVC que lhe acarretou hemiparesia completa e desproporcionada à direita, com predomínio bráquio-facil (excertos do laudo médico, datado de __ de __________ de 20__, em anexo). 

Em face da necessidade constante de acompanhamento por parte de terceiros, o Autor solicitou perante o INSS a majoração de aposentadoria, disposta no artigo 45 da Lei 8.213/91, pedido que fora negado, ensejando o presente processo. 

II - DO DIREITO 
O presente pedido, majoração de 25% do valor de benefício do Autor, tem amparo legal no artigo 45 da Lei Federal 8.213/91 e no artigo de mesma numeração do Decreto 3.048/99. 

artigo 45 do Regulamento da Previdência Social, Decreto 3.048/99, dispõe que: 

Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de vinte e cinco por cento, observada a relação constante do Anexo I, e: 

I - devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal; e 

II - recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado. 

Compreende-se que o intuito do legislador foi o de compensar os gastos do segurado com a contratação de uma pessoa que lhe proporcione a necessária e permanente assistência, ou, em muitos casos, o de compensar o familiar que lhe faça às vezes pelo consequente impedimento do exercício de atividade laborativa. 

Nesse sentido o voto do Desembargador Rogério Favreto: 

[...] a proteção complementar almejada pela norma é a vida, onde o norte deve ser a doença e suas decorrências, que importam na exigência do apoio de um terceiro para conferir o mínimo de dignidade humana e sobrevivência, segundo o preceito constitucional da cobertura do risco social - art. 201, inciso I, da Carta Federal. Para tanto, a lei criou um adicional financeiro no benefício previdenciário, objetivando dar cobertura econômica ao auxílio de um terceiro contratado ou familiar para apoiar o segurado nos atos diários que necessite de guarida, quando sua condição de saúde não suporte a realização de forma autônoma. (Apelação Cível nº 0017373-51.2012.404.9999/RS, 5ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Rogério Favreto. j. 27.08.2013, maioria, DE 13.09.2013). (Grifo nosso) 

O Anexo I do Decreto 3.048/99 relaciona, entre as situações em que o aposentado por invalidez terá direito à majoração de 25%, no item 9, a “incapacidade permanente para as atividades da vida diária”, na qual se enquadra o Autor. 

Assim, não restam dúvidas quanto ao direito do Requerente à majoração ora pleiteada. 

Nesse sentido, a jurisprudência: 

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. INCAPACIDADE. COMPROVAÇÃO. [...] 3. Quando o segurado necessitar de assistência permanente e for constatada a ocorrência da situação prevista em lei, impõe-se a incidência do disposto no art. 45 da Lei nº 8.213/91.(Apelação Cível nº 0016691-96.2012.404.9999/PR, 5ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira. j. 18.12.2012, unânime, DE 11.01.2013). 

PREVIDENCIÁRIO. ACRÉSCIMO DE 25% PREVISTO NO ART. 45. DA LEI Nº 8.213/1991. Segundo entendimento deste Tribunal, é devido o acréscimo de 25% sobre o valor da aposentadoria por invalidez, nos casos em que o segurado necessita de assistência permanente de outra pessoa, nos termos do art. 45 da Lei nº 8.213/91, o que não ficou evidenciado no caso dos autos. (Apelação Cível nº 0018989-61.2012.404.9999/RS, 5ª Turma do TRF da 4ª Região, Rel. Ricardo Teixeira do Valle Pereira. j. 18.12.2012, unânime, DE 15.01.2013). 

PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. COMPROVAÇÃO. ADICIONAL DE 25%. 1. Demonstrado que na data da cessação do auxílio doença a parte autora apresentava inaptidão para as atividades laborativas habituais, deve ser concedida a aposentadoria por invalidez. 2. Manutenção da sentença que concedeu o adicional de 25% à aposentadoria por invalidez da parte autora, pois demonstrado nos autos pela perícia oficial que o segurado necessita do cuidado permanente de outra pessoa para as atividades da vida diária, (...) (TRF4, AC 2009.72.99.002488-8, Sexta Turma, Relatora Loraci Flores de Lima, D.E. 10/06/2011) (Grifo nosso) 

Outrossim, a Instrução Normativa 45/2010 INSS/PRES esclarece que a majoração é devida desde a data do seu requerimento administrativo, confiramos: 

Art. 204. O aposentado por invalidez a partir de 5 de abril de 1991, que necessitar da assistência permanente de outra pessoa, terá direito ao acréscimo de vinte e cinco por cento sobre o valor da renda mensal de seu benefício,a partir da data do pedido do acréscimo, ainda que a soma ultrapasse o limite máximo do salário-de-contribuição, independentemente da data do início da aposentadoria. 

Desta forma, demonstrado o equívoco do indeferimento administrativo da majoração pretendida, é dever do Poder Judicial reparar o dano gerado ao Requerente, concedendo ao Autor o mencionado acréscimo desde a data do requerimento administrativo, ocorrido em __/__/20__. 

III - DA TUTELA DE URGÊNCIA 
Entende o demandante que a análise da medida antecipatória poderá ser melhor apreciada em sentença. 

Tratando a lide da concessão de recursos necessários ao custeio de uma vida digna ao segurado debilitado por moléstia incapacitante e à sua família, que em conjunto com esse arca com as despesas advindas com a situação, revela-se URGENTE uma célere resposta do Judiciário. 

O fundado receio de dano irreparável (periculum in mora) configura-se no fato de que o adequado e necessário amparo ao segurado debilitado, bem como o seu sustento e o sustento de sua família, restarão prejudicados com a demora na concessão da majoração de seu salário de benefício apto a arcar com as imperativas despesas. 

A verossimilhança da situação, muito embora de evidente constatação e comprovada por laudo médico particular, restará irrefutável após a realização da perícia pertinente ao caso, que comprovará a incapacidade permanente do segurado para as atividades da vida diária e a necessidade de ser permanentemente assistido. 

IV - DO PEDIDO 
Diante do exposto, requer: 

a) o recebimento e o deferimento da presente exordial, com a consequente citação da parte contrária - INSS, na pessoa de seu representante judicial, para que, querendo, apresente defesa; 

b) o deferimento da Antecipação de Tutela, com a apreciação em sentença do pedido de majoração de 25% do salário de benefício da aposentadoria do Autor; 

c) o deferimento do benefício da Assistência Judiciária Gratuita, com fulcro na Lei 1050/60, vez que o requerente não possui condições de arcar com o ônus processual da presente demanda sem comprometer o sustento de sua família. 

d) seja, ao final, julgada procedente a demanda, condenando-se a Autarquia Ré: 

- a implantar a majoração no benefício de aposentadoria por invalidez do Autor, nos termos do art. 45 da Lei 8.213/91, desde a data do pedido de benefício (__/__/201_), pagando parcelas vencidas e vincendas, aplicada correção e juros de mora; 

- em caso de recurso, ao pagamento de custas e honorários advocatícios, eis que cabíveis em segundo grau de jurisdição, com fulcro no art. 55 da Lei nº 9.099/95 c/c art. 1º da Lei nº 10.259/01. 

Protesta pela produção de todos os meios de prova, principalmente a documental e pericial. 

Atribui-se à causa o valor de R$ _______ (__________ reais). 


Nesses Termos; 
Pede Deferimento. 


__________, ___ de __________ de 20__. 





p. p. __________ 

OAB/UF nº _____ 




fonte: www.plenum.com.br

TNU - INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DO LAUDO QUE EMBASOU A SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA POR CONTRADIÇÃO. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE FONTE DE PESQUISA OU URL. PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS. TESE NOVA. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. Trata-se de pedido de uniformização apresentado pela parte autora recorrente contra acórdão que manteve sentença de improcedência de pedido de concessão de benefício de auxílio-doença. 2. Argumenta a recorrente que o laudo pericial produzido é contraditório por não ter apreciado as reais condições de saúde do autor, que seria incapaz de exercer seu labor rurícola. 3. O incidente não merece ser conhecido por diversas razões. 4. A petição do incidente deverá conter obrigatoriamente a demonstração do dissídio, fazendo o cotejo analítico em duas etapas: primeiro, pela comparação entre as questões de fato tratadas no acórdão impugnado e no paradigma, com reprodução dos fundamentos de ambos; depois, pelo confronto das teses jurídicas em conflito, evidenciando a diversidade de interpretações para a mesma questão de direito. 4.1 No caso dos autos, o autor limitou-se a transcrever ementas de diversos julgados, oriundos da TNU, do STJ e de outras Turmas Recursais, não demonstrando a similitude fático-jurídica entre os julgados paradigmas e o acórdão recorrido. 5. Em relação ao julgado admitido como paradigma pelo relator, julgado oriundo da TR/MG, tenho que este não atende ao disposto no art. 541, parágrafo único, do CPC. Não se trata de documento extraído dos autos originários, mas sim de julgado obtido por meio da internet, e o recorrente não indicou a fonte de pesquisa ou o endereço URL que permita seu acesso direto. Incidência da questão de ordem nº 03 deste Colegiado (A cópia do acórdão paradigma somente é obrigatória quando se tratar de divergência entre julgados de turmas recursais de diferentes regiões, sendo exigida, no caso de julgado obtido por meio da internet, a indicação da fonte eletrônica (URL). 6. De outra parte, extrai-se do incidente de uniformização que a pretensão do recorrente comprovar a incapacidade laborativa, a despeito das conclusões do laudo pericial em sentido diverso envolve reexame de provas, o que não é admitido pela Súmula nº 42 da TNU: "Não se conhece de incidente de uniformização que implique reexame de matéria de fato". 7. Por fim, constato que a tese defendida no incidente de uniformização não fora ventilada pelo recorrente em sede de recurso inominado. No recurso inominado o autor não pedira a anulação do laudo em virtude de contradição, mas sim questionava o acerto da decisão atacada e requeria a realização de perícia por junta médica para comprovação da incapacidade. 7.1 Incidência, no caso, da Questão de Ordem nº 10: "Não cabe o incidente de uniformização quando a parte que o deduz apresenta tese jurídica inovadora, não ventilada nas fases anteriores do processo e sobre a qual não se pronunciou expressamente a Turma Recursal no acórdão recorrido". 8. Pedido de uniformização não conhecido. (PEDILEF nº 05057824620074058103, TNU, Rel. Luiz Cláudio Flores da Cunha. j. 09.10.2013, DOU 18.10.2013)


fonte: www.plenum.com.br

TNU - INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO INTERPOSTO PELO RÉU. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. AVERBAÇÃO DE TEMPO RURAL RECONHECIDO EM SENTENÇA TRABALHISTA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. POSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 31 DA TNU. ACÓRDÃO RECORRIDO NO MESMO ENTENDIMENTO DA TNU. APLICAÇÃO DA QUESTÃO DE ORDEM Nº 13. INCIDENTE NÃO CONHECIDO. 1. Prolatado acórdão pela Primeira Turma Recursal de Santa Catarina, a qual manteve a sentença que julgou procedente o pedido de averbação de tempo rural reconhecido em sentença trabalhista homologatória de acordo, com a consequente concessão de aposentadoria por idade. 2. Pedido de uniformização de jurisprudência interposto, tempestivamente, pelo INSS, com fundamento no art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259/2001. Alegação de que o acórdão é divergente do entendimento do STJ, segundo o qual a sentença trabalhista homologatória de acordo somente poderá ser considerada como início de prova material se na referida ação trabalhista houver produção de provas. Cita como paradigmas os seguintes julgados: EREsp nº 616.242/RN, AgRg no REsp nº 837.979/MGE REsp nº 565.933/PR. 3. Incidente admitido na origem. 4. Esta TNU adotou entendimento no sentido de que a sentença trabalhista transitada em julgado, seja ela objeto ou não de homologação de acordo, serve como início de prova material. Nesse sentido, transcrevo a ementa do julgado desta TNU: "SENTENÇA TRABALHISTA HOMOLOGATÓRIA. EFICÁCIA. COISA JULGADA MATERIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ENTENDIMENTO ASSENTADO NA TNU. 1. O não reconhecimento da eficácia da sentença trabalhista transitada em julgado, seja ela objeto de homologação, sem a produção de prova, ou de julgamento meritório, com a produção de prova documental, naquele feito, fere o princípio da proteção da coisa julgada, consagrado em sede constitucional como corolário do sobre princípio da segurança jurídica, conforme entendimento assente nesta TNU. 2. Incide ao presente caso o artigo 468 do CPC, que dispõe que "a sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas". 3. Incidente de uniformização a que se nega provimento". (PEDILEF 200583005213238. Relator: Juiz Federal Otávio Henrique Martins Port, DJ: 15.03.2010). 5. Tal entendimento encontra-se consolidado através da Súmula nº 31, "in verbis": "A anotação na CTPS decorrente de sentença trabalhista homologatória constitui início de prova material para fins previdenciários" 6. No caso dos autos, o acórdão recorrido admitiu como início de prova material a sentença homologatória do acordo trabalhista em que houve o reconhecimento do vínculo empregatício desenvolvido pela parte autora, corroborado, ressalte-se, por prova testemunhal. Assim, tal entendimento está de acordo com o posicionamento consolidado desta TNU. Por tal razão, aplica-se a Questão de Ordem nº 13, "in verbis": "Não cabe Pedido de Uniformização quando a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais se firmou no mesmo sentido do acórdão recorrido". 7. Incidente não conhecido. (PEDILEF nº 50006508220124047213, TNU, Rel. Kyu Soon Lee. j. 09.10.2013, DOU 28.10.2013).



Fonte: www.plenum.com.br

Princípio da insignificância em crime ambiental

ROGER SPODE BRUTTI
Mestrando em Integração Latino-Americana pela UFSM
Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela ULBRA
Especialista em Direito Constitucional Aplicado pela UNIFRA
Especializando em Segurança Pública e Direitos Humanos pela FADISMA
Professor de Processo Penal da ACADEPOL/RS
Delegado de Polícia Civil/RS 



Cada caso é um caso. Não se pode, em Direito, dizer-se que determinado instituto, como o Princípio da Insignificância, jamais possa ser aplicado, por exemplo, a crimes ambientais, ou mesmo à pessoa reincidente.

Nesse sentido, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu, por maioria de votos, Habeas Corpus (HC 112563) e absolveu um pescador de Santa Catarina que havia sido condenado por crime contra o meio ambiente, no caso contra a fauna, por pescar durante o período de defeso, utilizando-se de rede de pesca fora das especificações do Ibama. Ele foi flagrado com apenas 12 camarões.

Diante de tal situação inusitada, foi a primeira vez que a Turma suso aplicou o princípio da insignificância em crime ambiental. E nem poderia ser de outra forma. O pescador, que é assistido pela Defensoria Pública da União (DPU), havia sido condenado a um ano e dois meses de detenção com base no artigo 34, parágrafo único, inciso II, da Lei 9.605/98.

O relator do HC, ministro Ricardo Lewandowski, havia negado a concessão do habeas corpus, mais foi vencido após divergência aberta pelo ministro Cezar Peluso, seguido pelo ministro Gilmar Mendes. Para Lewandowski, embora o valor do bem seja insignificante, o objetivo da Lei 9.605/98 é a proteção ao meio ambiente e a preservação das espécies. O relator acrescentou que não foi a primeira vez que o pescador agiu assim, embora não tenha sido enquadrado formalmente como reincidente no processo. “Esse dispositivo visa preservar a desova dos peixes e crustáceos, na época em que eles se reproduzem. Então se permite apenas certo tipo de instrumento para pesca, e não aquele que foi utilizado – uma rede de malha finíssima”, afirmou.

O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, asseverou que é preciso desenvolver uma doutrina a propósito do princípio da insignificância, mas salientou que no caso concreto analisado pareceu-lhe evidente a desproporcionalidade. Disse que a situação assemelha-se a um caso típico de crime famélico, sendo uma questão que desafia a Justiça Federal e também o Ministério Público, além de ser preciso encontrar outros meios de reprimir condutas como a dos autos, em que não parece razoável que se imponha essa espécie de sanção penal.

Assim, como bem se pode perceber, foi de todo acertado referido decisum emanado do STF a respeito. Afinal pergunta-se: seria a retirada de uma dúzia de camarões suficiente para desestabilizar o ecossistema de uma região?


Empresas do mesmo grupo econômico, ou pertencentes a parentes entre si, podem disputar a mesma licitação?

Por

IVAN BARBOSA RIGOLIN
Advogado/SP



Licitação. Pessoas jurídicas e pessoas físicas. Empresas do mesmo grupo em uma licitação. Empresas pertencentes a parentes entre si. 1. É princípio basilar de direito, consagrado há alguns séculos, que pessoas jurídicas não se confundem com as pessoas físicas suas proprietárias. Assim era em nosso anterior Código Civil, e assim permanece sendo no atual. Fora de outro modo, não haveria razão alguma para se instituírem empresas. 2. Em uma licitação, aberta indiscriminadamente aos fornecedores do ramo pertinente ao objeto licitado, podem regularmente participar quantas empresas desejarem, pertencentes ao mesmo proprietário, ou ao mesmo grupo, ou a proprietários vinculados por matrimônio, parentesco ou outra relação familiar, sem qualquer possível obstaculização pelo poder público, porque juridicamente insustentável.


Explicação inicial

Este artigo constitui ampliada atualização de outro, publicado em 2.002 em duas revistas técnicas sob o título Licitação – empresas do mesmo grupo econômico podem concorrer na mesma licitação. Insiste-se no tema, sobre o qual aliás pouco se escreve, em face à sua absoluta atualidade, ou mesmo seu permanente interesse. Dificilmente este assunto envelhecerá, como dificilmente a conclusão a que se chega será diferente desta aqui exposta – e se e quando o for não queremos estar presentes.

Nesta atualização se inclui referência ao pregão e à previsão do novo Código Civil equivalente ao art. 20 do antigo, ambos que ao tempo do texto originário inexistiam, e ainda a uma decisão do e. Tribunal de Contas da União no sentido da conclusão.

I - Temos recebido, ininterruptamente desde longa data, freqüentes consultas e indagações, quase invariáveis em seu teor, sobre a possibilidade jurídica de mais de uma empresa integrante do mesmo grupo econômico, ou da mesma família de proprietários, ou da mesma pessoa natural, ou pertencentes a pessoas casadas ou aparentadas entre si, participar como licitantes distintas de um mesmo procedimento licitatório instaurado pelo poder público.

Inquire-se nessas consultas, em suma, se sob o ponto de vista jurídico é legal ou regular, ou por outro lado seria irregular ou ilegal, a participação, em uma dada licitação, de empresas - pessoas jurídicas distintas - cujos quadros societários incluam pessoas unidas por vínculo familiar, ou econômico. Uma específica indagação foi sobre se poderiam concorrer entre si empresas sendo sócio de uma o marido da sócia de outra, porém variam as situações dentro desse sintetizado quadro. 

Informa-se ainda – e isso é importante - que os certames em questão são concorrências, tomadas de preços e pregões, presenciais e eletrônicos, e não convites.

A preocupação demonstrada em todas as consultas revela-se evidente, e é a seguinte: em participando do mesmo certame empresas do mesmo grupo, ou empresas a cujas propostas a(s) mesma(s) pessoa(s) teria(m) garantido acesso, esse fato porventura não afrontaria o princípio e a regra do sigilo das propostas, sabido e conhecido direito dos participantes de toda e qualquer licitação ?

Não favoreceria o conluio e os arranjos de toda ordem entre os participantes ? Não afrontaria tanto a regra da igualdade entre os licitantes quanto, por isso mesmo, à da competitividade ?

Antes de prosseguir seja reiteradoque não se fala neste momento de convites, mas apenas de concorrências, tomadas e de preços e pregões.

II - Não, é a resposta. Respondamos desde logo, para a seguir justificar.

Esse fato de empresas que concorram às mesmas licitações pertencerem ao mesmo grupo econômico, ou à mesma família, ou a sócios comuns, ou a amigos, associados ou colaboradores entre si, ou casados entre si, é bastante freqüente em licitações - e não apenas em nosso país -, e nada contém de irregular, antijurídico, condenável ou ilegal, e pelas mais variadas razões, como as seguintes:

1ª) quem, hoje no Brasil, tem a suficiente coragem pessoal de constituir uma média empresa comercial assume, desde logo, sérios compromissos financeiros relativos a investimentos necessários, que são mais seguros ou menos seguros;pesadíssimas obrigações tributárias e fiscais; pesadíssimas obrigações trabalhistas; pesadíssimos encargos previdenciários relativos aos empregados; grandes riscos comerciais frente à concorrência e às instabilidades do mercado, sem falar dos graves riscos de condenações judiciais em face de tudo aquilo, em diversas Justiças e variadas esferas judiciais. Somente para ilustrar com fato sabido, mais da metade das micro e das pequenas empresas instituídas no Brasil se encerram entre o primeiro e o segundo ano de existência.

O chamado “custo Brasil”, que é próprio do terceiro mundo e de nações subdesenvolvidas; que em nosso país obriga as pessoas a trabalharem mais de cinco meses a cada ano antes de ganharem para além de pagar tributos, e que no mais resume todos aqueles compromissos e riscos, constitui uma permanente espada de Dâmocles pendente sobre todo e qualquer intrepidismo empresarial, e sobre a cabeça e o pescoço de todo empresário nacional, desde o dia em que constitui a empresa até, quiçá, muitos anos após dissolvê-la;

2ª) se alguém ou se algum grupo familiar ou econômico, inobstante todo o risco e o complexo obrigacional mencionados, além de instituir uma empresa institui mais de uma com o mesmo objeto comercial, então além de se sujeitar mais de uma vez ao “custo Brasil” e a todas as vicissitudes acima apontadas, concorre consigo mesmo, e se uma de suas empresas ganhar a licitação outra estará perdendo, e precisará arcar com o preço disso;

3ª) visto isso, acusar de cartelização ou “lobby” a empresas de um mesmo grupo que concorram em um mesmo certame é repetir o episódio do ovo de Colombo: se é tão fácil, tão seguro, tão barato, tão simples e tão descomplicado constituir várias empresas, e as pôr para entre si concorrerem em certames licitatórios, então por que motivo mais empresários não o fazem? Se essa “mina de ouro” é tão acessível e cômoda, por que mais gente não constitui grandes redes empresariais e comerciais, para com isso ampliar as possibilidades de vencer concorrências abertas pelo poder público? 

Se manter diversas empresas, com dezenas, centenas ou milhares de empregados sustentados por atividades comerciais cujo mercado varia de a a z a cada dia que passa é mesmo algo tão confortável e prazenteiro, por que razão muito mais brasileiros não desfrutam de tais delícias ?

III - Fora irregular que empresas de um mesmo proprietário comparecessem às mesmas licitações, então uma empresa do grupo econômico Votorantim, durante muitos anos o maior do país, não poderia concorrer, em uma concorrência aberta a todas as empresas fornecedoras daquele mesmo objeto, com mais de uma empresa do grupo. Um banco, de um grupo econômico, não poderia concorrer com outro banco do mesmo grupo, em uma licitação aberta pelo poder público - e isto, em direito, é simplesmente ridículo. Ou do grupo Matsushita, ou do grupo GM, cujo orçamento mundial é maior que o do Brasil, ou do grupo Nestlé, ou do grupo Dupont, ou de tantos outros.

Ou de outro modo uma empresa não poderia propor um produto seu, e outra empresa do grupo propor outro produto, ambos que atendam o edital, como aliás é extremamente comum e usual em nosso país a cada dia que passa.

Fora irregular aquela “autoconcorrência”, então uma empresa do grupo a que pertence a construtora Camargo Correia, ou a OAS, ou a Andrade Gutierrez, ou a Mendes Júnior, ou a Constran, ou qualquer outra pertencente a algum grupo do mesmo imenso porte, que com freqüência vencem concorrências internacionais competindo com as maiores empresas do mundo, não poderia participar de certame do qual participasse outra do mesmo grupo - como se as empresas se confundissem com as pessoas naturais ou físicas de seus proprietários !

Fora aquilo irregular, então a fábrica Audi, que pertence à Volkswagen, estaria impedida de concorrer com a VW numa licitação para compra de veículos ! E, ao tempo em que existia a Autolatina, consórcio ou associação entre Ford e VW, ambas estariam proibidas de concorrer na mesma licitação ! 

Numa licitação para a compra ou o fornecimento de passagens aéreas, a empresa Rio-Sul, que pertencia à extinta Varig, não poderia participar, cotando seus preços, se a Varig também participasse. Nem a empresa Nordeste, que ao mesmo grupo pertencia em idos tempos. Nem alguma menor empresa do grupo TAM, se a própria TAM participasse. Ou da GOL.

Uma empresa do grupo empresarial Pão de Açúcar estaria impedida de concorrer com outra do grupo, no mesmo certame. Cada conglomerado econômico - desses gigantescos e quase indimensionáveis como o são o grupo Bradesco ou o Itaú - apenas poderia permitir que uma de suas empresas , dentre por vezes as centenas que o integram, participasse de cada licitação ! A fiscalização interna necessária haveria de ser então, e somente ela, fantástica !..

A Microsoft não poderia propor contra a Apple, [porque o principal acionista da primeira detém 30% da segunda...

Um canal integrante da Rede Globo não poderia propor em uma licitação da qual participasse outro, dentre as dezenas que a organização possui. E o mesmo se diga da Rede Bandeirantes de televisão, ou da rádio Jovem Pan. Uma faculdade do grupo X não poderia participar de um certame de que participasse outra do mesmo grupo.

Se a matéria é apenas para dar risada, então valem aquelas proibições.

IV - Quem, sendo de profissão jurídica, acaso não vislumbre o insuperável e despropositado ridículo contido em tais supostas, hipotéticas e fantasiosas proibições, então a nosso ver, e lamentavelmente, precisará reaprender os rudimentos do direito, os seus fundamentos basilares e os princípios verdadeiros que o informam e supedaneiam - e não aqueles inventados a cada dia que corre pelos moralistas de ocasião ou de fachada, e que servem a talho para oradores em formaturas de curso colegial por correspondência.

E precisará também cientificar-se de que o direito positivo há de ser objetivo e não se pode se prestar a discriminações ou a preferências momentosas ou da moda do dia, nem ditadas por impulso ou por confusa ideologia. A ciência jurídica jamais condiz com arroubos próprios de leigos ou tecnicamente desinformados, ou com os daqueles que no dizer correntio das pessoas ouvem cantar o galo sem saber onde, e que gostariam que o direito fosse como eles pretendem, e não como de fato é.

O direito não abriga preconceitos de nenhuma espécie, nem pode a sua aplicação prestigiar idéias precipitadas, tendenciosas, facciosas ou partidárias, ou aquelas que, por não meditadas por tempo bastante ou por não crivadas pela mais desinteressada reflexão, na sua pretensiosidade tangenciem a frivolidade e a leviandade. Direito não é entusiasmo – mesmo de idealistas ! ([1])

Julgar açodadamente alguma coisa, e decidir “pelo que está cheirando” constitui, em direito, atitude tão inculta quão perigosa, e de um tão irresponsável primitivismo que recorda o método da inquisição religiosa medieval, a conduzir invariavelmente ao abismo, ao retrocesso, ou, no mínimo, à estagnação cultural - que significa o mesmo.

V - Voltando ao plano prático das licitações e aos casos concretos que surgem na vida diária da Administração, tudo o que acima foi considerado é tanto mais ponderável quando se trata de alguma licitação que por força de lei é e precisa ser sempre aberta a todos os possíveis fornecedores que se habilitem, sem qualquer prévia restrição ou discriminação legalmente admissível como é o caso das concorrências, das tomadas de preços e dos pregões.

Isto, estas modalidades licitatórias, só em si, caracterizam ainda melhor a impossibilidade de se restringirem quaisquer participações, apenas porque acaso exista algum vínculo, seja familiar, seja empresarial, seja associativo de qualquer natureza, entre alguns licitantes, ou entre todos eles porventura.

Sim, porque em tais casos estaremos diante ou de uma concorrência, que é aberta indistintamente a todo e qualquer interessado, do ramo ou não, cadastrado ou não, que se habilite, ou então diante de uma tomada de preços, modalidade licitatória aberta a todos os fornecedores cadastrados ou que previamente como tal se habilitem no prazo da lei nacional de licitações, a Lei nº 8.666/93, em seu art. 22, § 2º, e que é de até três dias antes da abertura dos primeiros envelopes. 

Ou então, mais modernamente e de modo cada vez mais dominante e onipresente, estaremos em pregões, sejam presenciais bem a gosto dos antigos como o autor, sejam eletrônicos e virtuais, virtualmente detestados pelos mesmos antigos seres. Essa modalidade simplesmente arrebenta qualquer dirigismo, parcialidade, tendenciosidade ou facciosidade desde a origem, pois que representa o que existe de mais aberto, democrático, livre e participativo em tema de licitações.

Com efeito, dirigir maliciosamente um pregão – cujo edital seja isento e à prova de impugnações ou mandados de segurança - exige habilidades pouco comuns ao grosso das pessoas, e mais próprias de magos, adivinhos ou, prosaicamente, pajés, ou sejam seres dotados de clarividência e acaso voltados ao egoístico interesse, como poderiam não ser. Em não contando com tais apanágios, direcionar pregão constitui tarefa de Hércules.

Reitere-se agora que não se está diante, sequer, de carta-convite, que é pela mesma lei de licitações dirigida a certos e predeterminados fornecedores. Não ! Em absoluto, mesmo que a lei não pretenda viciar o certame mas apenas dirigi-lo a alguns fornecedores que, conhecidos da Administração, possam atender suas necessidades naquele certame. Nem isso, pois para evitar qualquer suspeição já de antemão excluímos o convite do escopo deste artigo.

Quanto ao convite, o e. Tribunal de Contas de União expediu acórdão em que assim decidiu sobre uma licitação dentro do sistema “S”:

“4. Na oportunidade, foi suscitado o entendimento estabelecido no Acórdão nº 297/2009-Plenário, que somente considera irregular a situação em apreço quando a participação concomitante das empresas se der em:

i. convite;

ii. contratação por dispensa de licitação;

iii. existência de relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; e

iv. contratação de uma das empresas para fiscalizar serviço prestado por outra.” (TC 019.123/2011-6. Natureza: Agravo.).

Ainda que não se consiga compreender o item ii, os três demais são claros: o e. TCU entende que apenas em um dado convite não podem empresas do mesmo grupo participar, e o motivo disso é que a competitividade sofre abalo quando é o mesmo grupo que compete entre si, por várias empresas de um só dono. Esse problema desaparece entretanto em concorrências, em tomadas de preços e em pregões, como o próprio TCU reconhece.

Sim, porque em uma concorrência existe uma absoluta universalidade de possíveis fornecedores. Em uma tomada de preços, se o ente público licitador tem um cadastro de fornecedores, então por força do [ultimo dispositivo citado, parte final, e como se irá concluir adiante, não se pode limitar previamente o número de participantes ! Esse mesmo acórdão do e. TCU, acima transcrito, fulmina o edital que proíba previamente a participação de empresas do mesmo grupo, a não ser, repita-se, em caso de convites.

E em um pregão multiplique-se a abertura e a impossibilidade de se direcionar viciosamente o certame, pois que o universo dos licitantes será absolutamente imponderável, e apenas se dará a conhecer no momento da realização, pois que qualquer licitante poderá a qualquer momento aparecer do nada, brotando espontaneamente para engrossar o número de interessados e para dificultar conluios, acertos ou arranjos.

VI - Se vem a Administração a saber, no desenrolar do certame, que dois ou mais participantes, pessoas jurídicas distintas, empresas separadas e autônomas cada qual com sua identidade empresarial e sua personalidade jurídica independente, pertencem ao, ou integram o, mesmo grupo, ou têm os mesmos sócios, ou têm sócios familiares entre si, ou entre si associados por algum modo admitido em direito, tudo o que tem a fazer é prosseguir desassombradamente o certame.

Sim, claro, e jamais proceder qual criança assustada ante algum fato inesperado, paralisando o certame de supetão ou quase em desespero, como se diante de seus olhos houvera irrompido o Satanás de sete barbas cuspindo chumbo derretido. Alude-se a isso, desse modo quase debochado porque amiúde algo, assim mesmo, ocorre em todo rincão da Administração pública brasileira.

Não deve para ninguém existir motivo de qualquer inquietação a simples constatação de que alguns dos licitantes têm origem no mesmo núcleo associativo, ou na mesma família, ou pertencem a parentes, ou aos mesmos sócios ou diretores, ou a marido e mulher. É juridicamente tão relevante constatar esse fato quanto o de se a capa da documentação de cada licitante é de uma cor diversa, ou se o papel sulfite de todos é de formato A-4, ou se algum é diferente.

Se os mesmos sócios constituíram empresas diferentes, sempre dentro do direito e das regras jurídicas que lhes eram aplicáveis, por alguma razão o fizeram - e não foi para divertimento. Se juridicamente o puderam fazer, e se pagaram para fazê-lo, e se corre cada um os riscos da empreitada, então devem corolariamente poder desfrutar os direitos que cada empresa isoladamente passou a ter, sem que nesse plexo de direitos possa interferir, um dia, o só fato de que exista outra empresa, de algum modo associada ou vinculada, também ocasionalmente participando da mesma licitação. O constitucional e livre exercício das profissões o assegura.

Nunca ninguém se olvide de que se uma empresa vence outra do mesmo empresário, então a mesma pessoa física está, como se disse ao início, ganhando de um lado e perdendo de outro, ou seja, em outros termos, derrotando a si mesmo. Mas as pessoas jurídicas nada têm com isso, e cada qual simplesmente está a exercer seus direitos comerciais, no estado democrático de direito ao qual todas pertencem e sob cujas regras foram instituídas.

VII - Jamais se confunda a pessoa jurídica com a pessoa física que a detenha - ninguém cometa esta infantilidade que reduz o direito a pó.

Fossem confundíveis aquelas duas realidades, então inexistiria qualquer razão para que existissem empresas. Não fora para que alguma vantagem, algum privilégio, alguma prerrogativa detivessem com relação aos homens que a instituíram - de natureza comercial, tributária, fiscal, institucional -, então nem uma empresa teria razão de ser em todo o planeta.
O anterior Código Civil brasileiro rezava:

“Art. 20. As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros.”

E o atual Código Civil, a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2.002, preconiza, semelhantemente, que

“Art. 52 Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.”,

sendo que pelo art. 50 apenas em caso de abuso da personalidade jurídica o juiz pode decidir, a requerimento da parte ou do Ministério público quando for o caso, que os efeitos de certas obrigações atinjam os bens particulares dos sócios – o que em absoluto e jamais é o caso aqui enfocado.Nada portanto tem a ver, como regra basilar e em casos regulares, a pessoa jurídica com as pessoas físicas que a criaram.

Assim é desde que a primeira pessoa jurídica foi instituída, e a doutrina não poderia dizê-lo diferente.

VIII - Washington de Barros Monteiro é um dos civilistas a realçar a fundamental diferença entre uma e outra espécie de pessoas:

“Outras disposições: - A teoria da personalidade jurídica é dominada por alguns princípios fundamentais: a) a pessoa jurídica tem personalidade distinta da de seus membros (universitas distat a singulis).” (In Curso de direito civil, 27ª ed. Saraiva, SP, 1.998, p. 101, com grifos originais).
De mesmo sentir é Silvio Rodrigues, para quem

“Na grande maioria dos casos, tais entes são constituídos pela união de alguns indivíduos; mas o que parece inegável é que a personalidade destes não se confunde com a daqueles, constituindo, cada qual, um ser diferente. Assim, o acionista de uma organização bancária não se confunde com esta; o sócio de um clube de uma sociedade limitada é um ser distinto da referida sociedade.

A estes seres, que se distinguem das pessoas que os compõem, que atuam na vida jurídica ao lado dos indivíduos humanos e quais a lei atribui personalidade, ou seja, a prerrogativa de serem titulares do direito, dá-se o nome de pessoas jurídicas, ou pessoas morais.

Pessoas jurídicas, portanto, são entidades a que a lei empresta personalidade, isto é, são seres que atuam na vida jurídica, com personalidade diversa da dos indivíduos que os compõem, capazes de serem sujeitos de direitos e obrigações na ordem civil.” (In Direito civil, 18ª ed. Saraiva, SP, 1.998, p. 66, com grifos originais). 

Não diriam diverso tais luminares do direito das gentes, nem diferente o fazem os demais, nem no Brasil nem em país institucionalizado algum

O Dicionário jurídico,planejado, organizado e redigido por J. M. Othon Sidou assim consigna estes verbetes:

“Pessoa Jurídica (1) Dir. Civ. Ente criado pela técnica jurídica, como unidade orgânica e estável e pessoas para fins de natureza pública ou privada, completamente distinta dos indivíduos que o compõem.” (In Dicionário jurídico, 4ª ed. Forense Universitária, RJ, 1.996, p. 594, com grifos originais).

O eminente juslexicólogo Pedro Nunes ensina, a seu turno:

“jurídica, a compreendida por uma entidade coletiva abstrata, legalmente organizada com fins políticos, sociais, econômicos e outros a que se destine, com existência autônoma, independente dos membros que a integram. É sujeito, ativo ou passivo, de direitos e obrigações.

As pessoas jurídicas são distintas das dos membros que as constituem.” (In Dicionário de tecnologia jurídica, 12ª ed. Freitas Bastos, RJ, 1.990, p. 652, com grifos originais).
E o magnífico e festejadíssimoVocabulário jurídico, de De Plácido e Silva, atualizado por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves, consagra as diferenças referidas no seguinte verbete:
“PESSOA JURÍDICA. Em oposição à pessoa natural, expressão adotada para indicação da individualidade jurídica constituída pelo homem, é empregada para designar as instituições, corporações, associações e sociedades, que, por força ou determinação da lei, se personalizam, tomam individualidade própria, para constituir uma entidade jurídica, distinta das pessoas que a formam ou a compõem.” (In Vocabulário jurídico, 18ª ed. Forense, RJ, 2.001, p. 609, com grifos originais).

Nem, portanto, os dicionários especializados permitem confundir pessoas jurídicas com pessoas naturais ou físicas, as quais em direito são tão semelhantes quanto um motorista e seu automóvel, e tão suscetíveis de confusão quanto aqueles.

IX - Se no direito civil a confusão entre pessoas jurídicas e físicas é inviável, também no ramo do direito administrativo, e precisamente em matéria de licitação, a confusão é impossível.

Luciano Ferraz, no Cap. IV - “Casuística, perguntas e respostas” - de sua monografia sobre o tema das licitações, respondendo à freqüente indagação que acaso constitui o objeto da indagação do consulente, assim respondeu:

“Poderão participar da licitação uma ou mais empresas que possuam sócios em comum?

Em princípio, nada obsta essa participação, já que a personalidade jurídica da sociedade não se confunde com a de seu sócio, salvo se comerciante individual.” (In Licitações - estudos e práticas, ed. Esplanada, RJ, 1.998, p. 108).

E é de observar que também a jurisprudência toma a mesma direção até aqui apontada.

O e. Superior Tribunal de Justiça, Primeira Turma, REsp. nº 51.540-8-RS, relator Min. Demócrito Reinaldo, j. em 15/12/97, assim já tem decidido:

“Restaria então ser apreciada a alegação de maltrato ao art. 20 do Código Civil, este sim prequestionado, e que, segundo sustenta o recorrente, restou violado, pois o acórdão hostilizado “considerou, de forma equivocada, não ter havido a competitividade na licitação, pelo fato das empresas que participaram do certame terem um sócio em comum. Ora, o fato das empresas que participaram da licitação terem um sócio comum é irrelevante, porquanto as pessoas jurídicas têm existência distinta dos seus membros” (fl. 276). (...)

É certo que o sistema e a lei cuidam da distinção da personalidade jurídica da sociedade daquela atinente aos que a compõem (v.g., Código Civil, art. 20; Dec.-lei nº 7.661, art. 5º) sendo correto que isto é produto do desenvolvimento do direito e com vistas a permitir-se a constituição de sociedades com limitação da responsabilidade dos sócios, para que empreendimentos alcancem vulto que a pessoa natural, isolada, não alcançaria.” (In BLC - Boletim de licitações e contratos, ed. NDJ, SP, junho/98, p. 328/9, com grifo nosso no primeiro parágrafo). 

X - Em freqüente questão veiculam-se hipóteses de associação entre pessoas físicas detentoras de diferentes pessoas jurídicas, seja a vinculação social, patrimonial, associativa, matrimonial, ou a que mais for.

Não constitui exceção um eventual vínculo matrimonial - e se alude a essa particular hipótese em face da sua curiosidade -, a tudo o que até aqui foi declinado acerca da inconfundibilidade entre pessoas físicas e pessoas jurídicas.

Tanto faz que a associação na constituição das empresas seja matrimonial, ou que seja comercial, ou que seja por outros vínculos familiares ou de parentesco, pois que juridicamente, para este efeito, todos dão no mesmo, e constituem uma só realidade: a vinculação, seja qual for, matrimonial ou não, jamais tem o condão de inabilitar, ou impedir, ou obstaculizar, ou travar, ou inviabilizar a participação de todas no mesmo certame licitatório - sobretudo em se tratando de modalidades licitatórias abertas pela lei a uma imprevisível e indefinível universalidade de participantes, como por excelência são os pregões e a concorrência, e um pouco menos a tomada de preços (apenas por causa do cadastramento prévio necessário, o que de resto é também factível a qualquer fornecedor interessado).

Quando se fala de concorrências acorre a definição ampla, indiscriminada e absolutamente generalizante do art. 22, § 1º, da Lei nº 8.666/93, que abre a modalidade a todo e qualquer interessado que previamente se habilite nos termos da mesma lei. Então, qualquer discrimen administrativo restaria evidentemente ilegal e fraudulento apenas porque os sócios dos licitantes diversos são associados.

Já quanto à modalidade da tomada de preços, reza a lei nacional de licitações e de contratos administrativos:

“Art. 22 São modalidades de licitação: (...)

§ 2º Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação.

Assim sendo, resta virtualmente inviável adivinhar-se quantos licitantes participarão da tomada de preços, pois basta que uma centena deles se habilite na forma da lei para que todos possam participar - e se nessa centena dezoito empresas pertencerem aos mesmos sócios, ou se quatro forem de uma mulher e quatro do seu marido, ou se uma for de um sócio e cada outra de um seu cunhado ou genro, o que juridicamente se poderá concluir é: sorte deles...

Nada mais, pois que cada empresa é um mundo isolado e autônomo, em direito. Independe do que quer que seja, ou de quem quer que seja alheio. Tem vida própria, capaz de assumir direitos e obrigações, e de contratar e de ser contratado sob sua conta e risco, e responsabilidade individual, em juízo e fora dele. Cada qual tem contabilidade própria, e será fiscalizada individual e separadamente. Terá bom êxito ou fracassará retumbantemente, porém sempre em caráter singular, isolado, autonômico, independente, incomunicável e desvinculado da vida das pessoas físicas que lhe sejam societariamente detentoras.

Aplicação do direito não é caça a fantasmas, nem pode ser. E nem pode o direito ser jogo de aparências, como o é o teatro de sombras, mas confrontação e intercombinação de fatos jurídicos, de realidades legais, de posturas institucionais predeterminadas, positiva e objetivamente.

Se o direito civil, e também o direito comercial, separam com absoluto rigor a pessoa física da jurídica, e se a lei de licitações em momento algum mistura ou confunde a ambas para nenhum efeito - como nunca o faria -, a ninguém que aplique esses direitos é dado subvertê-los para confundir água e óleo, em favor ou em desfavor de quem quer que seja.

XI - A quem insistir em que se participam empresas correlacionadas estar-se-á rompendo a regra (de resto principiológica) do sigilo das propostas, prevista no art. 43, inc. II, da Lei nº 8.666/93, objeta-se com o argumento de que não é o licitante quem precisa manter o sigilo de sua proposta, mas única e exclusivamente a Administração, e ninguém mais, até a abertura.

Se todos os licitantes quiserem anunciar em público e voz alta, antes, durante ou após a abertura de suas propostas, o seu conteúdo e as suas condições, ou se quiserem jogar de helicóptero cópias das suas propostas antes que sejam abertas, ou se as quiserem divulgar previamente na televisão, na internet ou no rádio, é claro que podem fazê-lo de modo absolutamente livre e desimpedido. Nada os impede, nem nunca impediu sequer por um segundo em toda história do direito, já que estão abrindo mão de um direito exclusivamente seu, particular e no qual a ordem pública não está envolvida.

Tal qual todo cidadão pode declarar em quem irá votar ou em quem votou na eleição para seu governante - inobstante a regra do voto secreto -, também em licitação essa regra vale por inteiro como proteção ao segredo comercial do particular, já que é apenas o poder público, o qual recebe os envelopes, que está obrigado ao sigilo e à custódia de proposta, intocada e indevassada, até sua abertura, quando então se torna pública.

Assim, é o poder público que está proibido de revelar o conteúdo das propostas em licitação até que no momento adequado sejam abertas, como é o poder público que está proibido de exigir a declaração do voto de cada eleitor, mas nunca o próprio eleitor, nem o licitante, de voluntariamente os declarar onde quer que seja.

O princípio do sigilo das propostas foi construído contra a Administração licitadora, como um limite à sua atuação e ao seu poder, e jamais contra o particular licitante, pois que nenhum sentido teria num estado em que todos têm liberdade de revelar, o que bem quiserem e a quem bem quiserem, a propósito de seus interesses comerciais. 

Guardar o sigilo das propostas é um direito do licitante contra a Administração pública, direito esse que lhe é dado pela lei em atenção a seu interesse privado e particular, e é por isso também um dever da Administração para com aquele interesse particular do licitante, porém jamais constitui qualquer dever do licitante.

O licitante, como o eleitor, guarda os segredos que bem quiser, mas também revela a quem quiser que seja. Quem não revela os seus segredos é o poder público, jamais, se a lei disso o impede.

XII - Em conclusão, visto o exposto, responde-se à fundamental indagação, objeto deste artigo e exposta ao início, de modo negativo.

Jamais em direito, seja de licitações, seja do ramo que for, poderá o aplicador baralhar os conceitos de pessoa jurídica com o de pessoa física para pretender prejudicar o direito de empresas, por qualquer modo associadas, de livre e desembaraçadamente participarem de uma mesma licitação, apenas pelo fato de que os sócios de uma são associados, ou economicamente conglomerados, ou familiares, ou matrimonialmente vinculados a sócios de outra.

Foram eles não apenas associados ou até mesmo casados entre si, mas as mesmas pessoas físicas, ainda assim nenhum prejuízo poderia ser oposto por ninguém à participação plena de todas as suas empresas no mesmo certame licitatório apenas por esse fato, vez que no direito aplicável tal circunstância não apresenta nem contém a mínima relevância.

Ressalva-se o caso do convite, e não porque a lei o exclua mas por simples lógica: se os convidados são sabidamente do mesmo grupo, compromete-se inevitavelmente a competitividade essencial ao certame.




fonte: www.plenum.com.br  

A última pérola do Supremo Tribunal Federal: o advogado não pode ser paciente em habeas corpus

Por RÔMULO DE ANDRADE MOREIRA
Promotor de Justiça
Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais do Ministério Público do Estado da Bahia
Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador - UNIFACS
Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal)
Especialista em Processo pela UNIFACS (Curso Coordenado pelo Professor Calmon de Passos)
Coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da UNIFACS
Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático


"Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há-de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há-de precipitar a tua audácia sem freio? (...) Ó tempos, ó costumes!"[1]

Em recentíssima decisão, por inadequação da via processual, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal não conheceu o Habeas Corpus nº. 118913 impetrado pelo advogado W.A.R., preso preventivamente e denunciado pelos crimes de formação de quadrilha, fraude processual, falsidade ideológica e estelionato. O relator, Ministro Luiz Fux (que, decididamente, não sabe nada de Direito Processual Penal), pronunciou-se pela extinção do processo, e foi seguido por maioria dos votos da Primeira Turma. O Ministro destacou que a acusação trata de crimes supostamente praticados por um advogado, “que tem o dever ético de velar pela inteireza da esfera jurídica das pessoas”. Ao considerar prematuro o Habeas Corpus, o relator julgou extinta a ordem por inadequação da via eleita: “A nossa jurisprudência tem sido bastante severa com a prática de ilícitos por parte de estelionatos advocatícios”, observou o relator. Ele foi acompanhado pelos Ministros Roberto Barroso, Dias Toffoli e Rosa Weber (idem), ficando vencido o Ministro Marco Aurélio (para variar...).

Sem adentrar o mérito (se devia ou não ser concedida a ordem), a questão que causa estranheza é o não conhecimento do Habeas Corpus pela sua suposta inadequação processual! O que tem a ver uma coisa com a outra? O que tem a ver o dever ético do advogado “de velar pela inteireza da esfera jurídica das pessoas” com o interesse-adequação em uma ação penal como é o processo do Habeas Corpus? O que tem a ver “a prática de ilícitos por parte de estelionatos advocatícios” com o exercício da ação penal e com a utilização de uma garantia constitucional? Se fosse o caso, o pedido deveria ser conhecido (afinal de contas o paciente está preso!) e, no mérito, denegada seria a ordem (se não tivesse caracterizado o abuso de poder ou ilegalidade na decisão da prisão preventiva).

Confundiu-se, desgraçadamente, “alhos com bugalhos” e, lamentavelmente, mais uma vez, a Suprema Corte fechou os olhos para uma (única e eficaz) garantia constitucional que temos para o direito de locomoção.

Pontes de Miranda, se vivo, espernearia! Rui Barbosa, pior! Pedro Lessa ficaria ruborizado... Óbvio que não falarei de João Sem-Terra, nem dos barões ingleses, pois estes, muito possivelmente, não tinham ideia do bem que faziam àquela altura para a liberdade humana (Carta Magna , 1215).

Em outras oportunidades já afirmamos, e agora reiteramos (ipsis litteris), como é lamentável que o habeas corpus vem sendo achincalhado pelos nossos juízes, tribunais e, incrivelmente, pela Suprema Corte (veja, por exemplo, o esdrúxulo Enunciado 691 da súmula do Supremo Tribunal Federal).

Aliás, anteriormente, a Primeira Turma já havia reformado o seu entendimento para não mais admitir habeas corpus que tenham por objetivo substituir o Recurso Ordinário em Habeas Corpus. Segundo o entendimento da Turma, para se questionar uma decisão que denega pedido de habeas corpus, em instância anterior, o instrumento adequado é o Recurso Ordinário e não o habeas corpus. A mudança ocorreu durante o julgamento do Habeas Corpus (HC) 109956, quando, por maioria de votos, a Turma, acompanhando o voto do relator do processo, Ministro Marco Aurélio (quem diria...), considerou inadequado o pedido de habeas corpus de um homem denunciado pela prática de crime de homicídio qualificado. Segundo o Ministro Marco Aurélio, relator, há alguns anos o Tribunal passou a aceitar os habeas corpus substitutivos de recurso ordinário constitucional, mas quando não havia a sobrecarga de processos que há hoje. A Ministra Rosa Weber acompanhou o voto do ministro-relator no que chamou de “guinada de jurisprudência”, por considerar o habeas corpus, em substituição ao recurso constitucional, um meio processual inadequado. A Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha e o Ministro Luiz Fux também votaram no sentido do novo entendimento. A questão foi decidida no julgamento do HC 109956, mas começou a ser discutida quando a Turma analisou o HC 108715, durante a apresentação de uma questão preliminar no voto do relator do processo, Ministro Marco Aurélio. Em sua preliminar, o Ministro defendeu que a Turma não mais admitisse o uso do Habeas Corpus para substituir o Recurso Ordinário em Habeas Corpus. Segundo o Ministro Marco Aurélio “o habeas corpus substitutivo do recurso ordinário, além de não estar abrangido pela garantia constante do inciso LXVIII do artigo 5º do Diploma Maior, não existindo sequer previsão legal, enfraquece este último documento, tornando-o desnecessário no que, nos artigos 102, inciso II, alínea “a”, e 105, inciso II, alínea “a”, tem-se a previsão do recurso ordinário constitucional a ser manuseado, em tempo, para o Supremo, contra decisão proferida por Tribunal Superior indeferindo ordem, e para o Superior Tribunal de Justiça contra ato de Tribunal Regional Federal e de Tribunal de Justiça”. E acrescentou: “o Direito é avesso a sobreposições e impetrar-se novo habeas, embora para julgamento por tribunal diverso, impugnando pronunciamento em idêntica medida implica inviabilizar, em detrimento de outras situações em que requerida, a jurisdição”. No julgamento desse habeas corpus (108715) o Ministro Luiz Fux lembrou que assim como o Tribunal já decidiu que não cabe Mandado de Segurança como substituto de recurso ordinário, assim também deve ser para “não vulgarizar a utilização do habeas corpus”. Fonte: STF.

Ora, como se sabe, o habeas corpus deve ser necessariamente conhecido e concedido sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, pois se visa à tutela da liberdade física, a liberdade de locomoção do homem: ius manendi, ambulandi, eundi ultro citroque. Como já ensinava Pontes de Miranda, em obra clássica, é uma ação preponderantemente mandamental dirigida “contra quem viola ou ameaça violar a liberdade de ir, ficar e vir.”[2]

Para Celso Ribeiro Bastos “o habeas corpus é inegavelmente a mais destacada entre as medidas destinadas a garantir a liberdade pessoal. Protege esta no que ela tem de preliminar ao exercício de todos os demais direitos e liberdades. Defende-a na sua manifestação física, isto é, no direito de o indivíduo não poder sofrer constrição na sua liberdade de se locomover em razão de violência ou coação ilegal.”[3] Aliás, desde a Reforma Constitucional de 1926 que o habeas corpus, no Brasil, é ação destinada à tutela da liberdade de locomoção, ao direito de ir, vir e ficar.

Ademais, não há falar-se em “inadequação da via processual” quando o paciente está preso preventivamente. Poder-se-ia, como já afirmamos, denegar a ordem, óbvio, mas não deixar de conhecer a ação.

Não por menos, Julian Lopez Masle e Maria Inês Horvitz afirmam que “(...) el principio de inocência no excluye, de plano, la posibilidad de decretar medidas cautelares de carácter personal durante el procedimiento. En este sentido, instituiciones como la detención o la prisión preventiva resultan legitimadas, en principio, siempre que no tengan por consecuencia anticipar los efectos de la sentencia condenatória sino asegurar fines del procedimiento”[4]

O problema, no fundo no fundo, ainda é o nosso Código de Processo Penal (e não só ele, óbvio…). A propósito, Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, afirma que “a questão é tentar quase o impossível: compatibilizar a Constituição da República, que impõe um Sistema Acusatório, com o Direito Processual Penal brasileiro atual e sua maior referência legislativa, o CPP de 41, cópia malfeita do Codice Rocco de 30, da Itália, marcado pelo princípio inquisitivo nas duas fases da persecutio criminis, logo, um processo penal regido pelo Sistema Inquisitório. (...) Lá, como é do conhecimento geral, ninguém duvida que o advogado de Mussolini, Vincenzo Manzini, camicia nera desde sempre, foi quem escreveu o projeto doCodice com a cara do regime (...) ”[5]

Afinal de contas, como já escreveu Cappelletti, “a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todas.”[6] Devemos interpretar as leis ordinárias em conformidade com a Carta Magna, e não o contrário! Como também magistralmente escreveu Frederico Marques, a Constituição Federal “não só submete o legislador ordinário a um regime de estrita legalidade, como ainda subordina todo o sistema normativo a uma causalidade constitucional, que é condição de legitimidade de todo o imperativo jurídico. A conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todos.”[7]

James Goldshimidt[8] já afirmava no clássico “Problemas Jurídicos e Políticos del Proceso Penal” que a estrutura do processo penal de um país indica a força de seus elementos autoritários e liberais.[9]

Abaixo, portanto, aos chavões, meramente retóricos e fascistas, tais como “dever ético de velar pela inteireza da esfera jurídica das pessoas” e confundir ética com condição para o exercício da ação penal do Habeas Corpus.



[1] Palavras que Marco Túlio Cícero, o maior orador romano de todos os tempos (que ascendeu à posição de cônsul, entre os anos de 64-63 a .C), dirigiu ao seu grande rival na disputa pela mais alta posição da Magistratura de Roma, Lúcio Sergio Catilina. Certo dia, Cícero foi ao Senado e disse em frente a Catilina e aos presentes, para que todos ouvissem, o seguinte: "Até quando, ó Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há-de zombar de nós essa tua loucura? A que extremos se há-de precipitar a tua audácia sem freio? Nem a guarda do Palatino, nem a ronda noturna da cidade, nem os temores do povo, nem a afluência de todos os homens de bem, nem este local tão bem protegido para a reunião do Senado, nem o olhar e o aspecto destes senadores, nada disto conseguiu perturbar-te? Não sentes que os teus planos estão à vista de todos? Não vês que a tua conspiração a têm já dominada todos estes que a conhecem? Quem, de entre nós, pensas tu que ignora o que fizeste na noite passada e na precedente, em que local estiveste, a quem convocaste, que deliberações foram as tuas. Ó tempos, ó costumes!"


[2] História e Prática do Habeas Corpus, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1999, p. 39.


[3] Comentários à Constituição do Brasil, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 312.
[4] Derecho Processual Penal Chileno, Tomo I, Santiago do Chile : Editorial Jurídica de Chile, 2003, p. 83.]


[5] O Núcleo do Problema no Sistema Processual Penal Brasileiro, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 175, junho/2007, p. 11.


[6] Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.


[7] Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 79.


[8] Para Jacinto Nelson de Miranda Coutinho, “nunca foi tão importante estudar os Goldschmidt, mormente agora onde não se quer aceitar viver de aparências e imbrogli retóricos.” (O Núcleo do Problema no Sistema Processual Penal Brasileiro, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, nº. 175, junho/2007, p. 12).


[9] ApudJosé Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 37.




sábado, 14 de dezembro de 2013

Parâmetros de Eficácia e Critérios de Interpretação do Precedente Judicial

Autor:
TUCCI, José Rogério Cruz e


RESUMO: Atualmente, inúmeras e intrincadas são as questões que emergem da complexa temática relacionada ao precedente judicial (a decisão individualizada de um caso concreto). Costuma-se indicar os sujeitos da argumentação jurídica com a fórmula "doutrina e jurisprudência", mas a doutrina que o juiz utiliza ao proferir a sentença é, no mais das vezes, a doutrina individuada, selecionada e ilustrada pelo advogado, cuja obra passa despercebida. Mais: costuma-se afirmar que são a doutrina e a jurisprudência as fontes responsáveis pelas inovações no campo do direito. Contudo, quantas vezes essas inovações, cuja paternidade é atribuída aos tribunais, foram sugeridas nos arrazoados dos advogados. É fundamental o papel do advogado na construção dos precedentes judiciais. Desse modo, tanto nos países de common law quanto de civil law, estabelece-se um diálogo perene entre os operadores do direito, na consecução de um fim perseguido por todos, vale dizer, a interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

PALAVRAS-CHAVE: Precedente Judicial. Repercussão em Julgamentos Futuros. Interpretação.

1 À Guisa de Introdução

Na atualidade, qualquer que seja a experiência jurídica, inúmeras e cada vez mais intrincadas são as questões que emergem da complexa temática relacionada ao precedente judicial(1).

Basta consultar, v.g., para ter-se a exata compreensão dessa tendência metodológica, a importante coletânea coordenada por Neil MacCormick e Robert Summers, sob o título Interpreting Precedents: a Comparative Study, que encerra 18 preciosos ensaios dedicados à influência da jurisprudência em países de common law e de civil law(2).

Acerca desse assunto, instado, por força de pesquisa acadêmica, a examinar a doutrina de Francesco Galgano, renomado privatista da Universidade de Bolonha e autor da mais completa obra já escrita sobre negócio jurídico(3), deparei-me com o título de um artigo que me chamou a atenção: Il Contraddittorio Processuale È Ora Nella Costituzione(4).

Galgano, em princípio, preocupara-se com a nova redação do art. 111 da Constituição italiana, introduzida em 1999, que passou a contemplar, de modo expresso e incisivo, a garantia do contraditório efetivo em toda espécie de processo contencioso.

Imaginei que se tratava, até mesmo pelas dimensões do escrito (apenas 5 páginas), de singelo comentário, de um jurista teórico, sobre tema de direito processual constitucional.

No entanto, atraído pela curiosidade, fiquei realmente surpreso com a indagação preambular formulada pelo referido autor, qual seja onde é que se encontra a legitimação do juiz para proferir o julgamento?

Respondendo que a investidura do juiz provém da lei, mas a legitimação da sentença decorre da efetiva participação e defesa dos litigantes, Galgano destaca ser inviolável a atuação profissional do advogado.

Costuma-se indicar os sujeitos da argumentação jurídica com a fórmula "doutrina e jurisprudência", mas a doutrina que o juiz utiliza ao proferir a sentença é, no mais das vezes, a doutrina individuada, selecionada e ilustrada pelo advogado, cuja obra passa despercebida. Mais: costuma-se afirmar que são a doutrina e a jurisprudência as fontes responsáveis pelas inovações no campo do direito.

Contudo, quantas vezes essas inovações, cuja paternidade é atribuída aos tribunais, foram sugeridas nos arrazoados dos advogados. Assim, sob esse aspecto, que não é de secundária importância - aduz o jurista peninsular -, a contribuição criativa do advogado à administração da justiça merece ser certificada e valorizada...

E, assim, nesse contexto, vem sobrelevado o fundamental papel do advogado na construção dos precedentes judiciais. Longe de constituir obra exclusiva do órgão jurisdicional, assevera Galgano, à luz da experiência prática do direito, que a produção e constante evolução da jurisprudência é fruto do esforço conjunto dos juízes e dos advogados.

A estes, de um modo geral, cabe a criação e o aprimoramento das teses jurídicas que são diuturnamente submetidas à apreciação daqueles. Ato contínuo, a orientação adotada pelas cortes de justiça presta-se, a seu turno, a subsidiar os arrazoados dos defensores dos interesses em jogo, que passam a invocar os posicionamentos pretorianos já consolidados, e assim por diante...

Desse modo, tanto nos países de common law quanto de civil law, estabelece-se um diálogo perene entre os operadores do direito, na consecução de um fim perseguido por todos, vale dizer, a interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

2 Repercussão do Precedente Judicial nos Futuros Julgamentos

É, assim, interessante notar, já sob outro enfoque, que a dimensão da eficácia do precedente concerne à intensidade da influência que ele exerce sobre a decisão de um caso futuro. O ponto de referência normativo no âmbito do common law é exatamente o precedente judicial, enquanto, no tradicional sistema de fontes do direito que vigora nos países regidos pelo civil law, o precedente, geralmente dotado de força persuasiva, é considerado fonte secundária ou fonte de conhecimento do direito(5).

O precedente judicial é, pois, um fenômeno extremamente difuso, presente e relevante nos modelos jurídicos de época contemporânea, cada vez mais reforçado pela função de interpretação e aplicação uniforme (nomofilácica) do direito pelas Supremas Cortes(6).

Existem, como se observa, "degraus" ou "parâmetros" de eficácia das decisões judiciais em relação a subsequentes julgamentos. A doutrina estrangeira, de fato, refere-se a "degrees of normative force"(7).

Taruffo e La Torre (8), a seu turno, observam que, no sistema italiano, é a posição hierárquica do tribunal que determina o "grau de força persuasiva" dos precedentes. Desse modo, aqueles provenientes da Corte Constitucional, da Corte de Cassação e do Conselho de Estado (em matéria administrativa) detêm maior eficácia em relação àqueles proferidos pelos demais tribunais da Itália.

Com efeito, o valor intrínseco do precedente judicial, que constitui o ponto de referência normativo de toda a teoria do stare decisis (da expressão latina: stare decisis et non quieta movere = mantenha-se a decisão e não se moleste o que foi decidido), projeta uma eficácia de altíssimo grau, dita vinculante, nos julgamentos sucessivos proferidos em causas análogas.

Anota Schauer que os tribunais do common law devem se curvar ao precedente da mesma forma que devem seguir a Constituição e, ainda, outros textos legais (statutes) (9).

O conceito de ratio decidendi (ou também holding), na qual se escuda a doctrine of binding precedent, mostra que é a tese jurídica suficiente a decidir o caso concreto (rule of law), e não a parte dispositiva da decisão, que produz eficácia vinculante e que deve nortear a interpretação judicial em momento posterior.

Ressalte-se, por outro lado, que, nos sistemas jurídicos de civil law, o precedente judicial ostenta, em regra, apenas força persuasiva. Tal eficácia, dependendo de inúmeras variantes, pode ser maior ou menor.

Importa esclarecer, outrossim, que em determinados ordenamentos jurídicos de direito escrito, como, e.g., o da Espanha e o do Brasil, adota-se um modelo misto, vale dizer, de precedentes vinculantes e de precedentes persuasivos.

3 Stare Decisis: Tradição e Praxe Judiciária

Matthew Hale, autor de clássica história do common law, asseverava, ainda no século XVII, que as decisões judiciais possuíam grande peso e autoridade, especialmente quando congruentes com anteriores julgamentos (10).

Aduza-se, por oportuno, que até o século XVIII os denominados Law Reports eram coletâneas particulares e, portanto, assegurava-se aos juízes ampla discricionariedade em acolher ou não um determinado precedente judicial.

Partindo desse pressuposto, afirmava Blackstone que a antiga regra de julgar com base no precedente paradigma poderia sofrer exceção quando a anterior decisão fosse contrária à razão ou, ainda, com maior evidência, contrária à lei divina; "mas, mesmo nessas hipóteses" - continuava - "o precedente não deve ser seguido, ainda que os juízes subsequentes não pretendam criar direito, mas reproduzir o velho, conquanto errado" (11).

Na experiência jurídica inglesa, com a maturação necessária, a regra do precedente é aperfeiçoada, entendendo-se que não era o caso julgado em si que irrompia importante, mas, sim, a ratio decidendi, isto é, a tese ou o princípio de direito contido na sentença.

Chief Justice Lord Mansfield, destacado magistrado da segunda metade do século XVIII, afirmou, em sucessivos julgamentos, que: "o direito da Inglaterra seria mesmo uma estranha ciência se as decisões se fundassem apenas nos precedentes. Na verdade, os precedentes servem para iluminar os princípios e para conferir-lhes estável certeza" (12).

É, então, a partir das primeiras décadas do século XIX que vem reconhecida a eficácia vinculante do precedente judicial.

Na conhecida decisão do caso Beamisch v. Beamisch, conduzida, em 1861, pelo Lord Campbell, ficou virtualmente estabelecido que a House of Lords estaria obrigada a acatar a sua própria autoridade proclamada nos julgamentos: "(...) o direito declarado na ratio decidendi, sendo claramente vinculante para todas as cortes inferiores e todos os súditos do reino, se não fosse considerado igualmente vinculante para os Law Lords, a House of Lords se arrogaria o poder de alterar o direito e legiferar com autônoma autoridade".

Desse modo, e por paradoxal que possa parecer, verifica-se que "a doctrine of precedent vem ancorada à teoria constitucional da separação dos poderes e da supremacia do Parlamento, tornando 'heresia' qualquer tentativa de superá-la" (13).

No entanto, a mesma corte de justiça já havia declarado, anos antes, em Bright v. Hutton (1852), que, a exemplo de qualquer tribunal, "ela também possuía um inerente poder para corrigir eventuais erros que porventura tivesse cometido".

Segundo consta, a House of Lords exerceu, pela primeira vez, essa prerrogativa uma centúria depois, somente em 26 de julho 1966, ocasião em que o Chancellor Lord Gardner proclamou, em nome de todos os componentes da corte, em uma resolução específica - Practice Statement of Judicial Precedent -, que era prudente rever orientação emitida no passado, quando parecesse correto: "Os Law Lords consideram o uso do precedente um indispensável fundamento para determinar o direito e sua aplicação aos casos individuais. Este fornece pelo menos um grau de certeza sobre o qual os cidadãos podem nortear a conduta dos próprios negócios, e também uma base para o desenvolvimento ordenado das regras legais. Os Law Lords, todavia, reconhecem que a adesão muito rígida ao precedente pode trazer injustiças em certos casos, e ainda restringir indevidamente a evolução futura do direito. A despeito de ser normalmente vinculante um precedente pronunciamento da House of Lords, os seus integrantes propõem modificar a praxe atual, podendo superar uma precedente decisão quando pareça oportuno ('[...] when it appears right to do so')".

Esse Practice Statement assinalou, com certeza, marcante mudança de rumo na teoria do stare decisis, embora a aplicação prática dessa nova concepção sempre fosse muito reduzida: o primeiro caso registrado de overruling em tais termos é de 1968, seguindo-se-lhe um número insignificante (14).

É evidente que aquela anterior postura, de intransigente rigidez, colocava a magistratura inglesa em difícil situação diante da evolução natural do direito. Revelava-se, portanto, de todo procedente a afirmação que se tornou famosa, formulada por Arthur Goodhart na primeira metade do século XX, no sentido de que: "o juiz inglês é um escravo do passado e um déspota do futuro"(15).

Aduza-se que a moderna teoria do stare decisis, governada pelo princípio do precedente (vertical) com força obrigatória externa para todas as cortes inferiores, veio definitivamente consagrada em prestigiada doutrina de um dos maiores juristas ingleses de todos os tempos, Sir Baron Parke J., que, por certo, inspirado na velha lição de Blackstone, escreveu: "o nosso sistema de common law consiste na aplicação, a novos episódios, de regras legais derivadas de princípios jurídicos e de precedentes judiciais; e, com o escopo de conservar uniformidade, consistência e certeza, devemos aplicar tais regras, desde que não se afigurem ilógicas e inconvenientes, a todos os casos que surgirem; e não dispomos da liberdade de rejeitá-las e de desprezar a analogia nos casos em que ainda não foram judicialmente aplicadas, ainda que entendamos que as referidas regras não sejam tão razoáveis e oportunas quanto desejaríamos que fossem. Parece-me de grande importância ter presente esse princípio de julgamento, não meramente para a solução de um caso particular, mas para o interesse do direito como ciência"(16).

A doctrine of binding precedent, já declarada com todas as letras no caso Beamisch v. Beamisch, repetida no caso Bradford v. Pickles (1895), vem definitivamente reconhecida, em 1898, no caso London Tramways Company v. London County Council, ocasião em que a House of Lords reiterou a obrigatoriedade de nortear-se pelas suas próprias anteriores decisões (efeito autovinculante), como, ainda, patenteou a eficácia externa destas a todas as cortes de grau inferior.

Tratava-se de uma ação condenatória promovida pela empresa privada de transporte que fora "desapropriada" pelo governo municipal, na qual pretendia indenização equivalente à soma do patrimônio imobilizado e, ainda, do good will value, isto é, da previsibilidade futura de lucro, enquanto o demandado afirmava que devia ser considerado apenas o montante relativo ao maquinário e ao estabelecimento. A diferença monetária, à toda evidência, era enorme.

Sucede que, quatro anos antes, a justiça inglesa tinha sido instada a examinar um caso análogo (London Sreet Tramways Lt. v. London County Council [1894]). Já existia, portanto, pelo menos um valioso precedent in point da House of Lords (17).

O trecho realmente importante desse histórico documento foi o em que constou a afirmação peremptória do Lord Halsbury, no sentido de que tal regra estava "assentada desde há alguns séculos" (for several centuries) (18).

Além da força obrigatória do precedente (binding precedent), que é conotação essencial de toda a teoria do stare decisis, vem ela também caracterizada por uma hierarquia funcional muito bem articulada.

Os Judicatures Acts, de 1873 a 1875, que regulamentaram as regras da equity, estabeleceram, ainda, a fusão e a moderna estrutura das cortes de justiça inglesas.

O efeito vinculante das decisões já proferidas encontra-se condicionado à posição hierárquica do tribunal que as profere. Normalmente, na experiência jurídica do common law, o julgado vincula a própria corte (eficácia horizontal interna), bem como todos os órgãos inferiores (eficácia vertical externa). Não se delineia possível, à evidência, a aplicação dessa regra em senso contrário.

No Reino Unido, pois, todo precedente judicial da House of Lords, de natureza colegiada ou monocrática, reveste-se de força vinculante no âmbito das cortes inferiores, ou seja, a Court of Appeal, a High Court, as Crown Courts, as County Courts e as Magistrates Courts, todas evidentemente dotadas de competência recursal e originária especificamente definidas.

Com a mesma força obrigatória, os julgados da Court of Appeal vinculam, em casos análogos, as suas decisões futuras e aquelas dos tribunais de grau menos elevado (19).

Observe-se, por outro lado, que o estilo de julgamento, no âmbito do common law, é caracterizado pela "autorreferência" jurisprudencial. Na verdade, pela própria técnica do precedente vinculante, impõe-se, na grande maioria das vezes, a exigência de que a corte invoque, para acolher ou rejeitar, julgado ou julgados anteriores. Em outras palavras, a fundamentação de uma decisão deve, necessariamente, conter expressa alusão à jurisprudência de tribunal superior ou da própria corte.

Já no que concerne à experiência dos Estados Unidos, desde a época de sua colonização, o sistema baseado no case law vigora em praticamente todo o território norte-americano. No entanto, por inúmeras razões, durante o século XVIII, o direito dos Estados Unidos distanciou-se da antiga tradição jurídica da Grã-Bretanha.

A estrutura constitucional assentada no federalismo e na rígida divisão de poderes acarretou ao ordenamento jurídico dos Estados Unidos profundos contrastes em relação ao direito inglês.

Ressalte-se, no entanto, que, sob o ponto de vista histórico, o direito norte-americano, apesar de fragmentado, seguiu, pari passu, a experiência jurídica britânica até a promulgação da Constituição dos Estados Unidos, em 1787.

Importa registrar que a recepção do common law nos Estados Unidos não se fez de modo automático. As realidades de uma nação do Novo Mundo, com as dimensões continentais dos Estados Unidos, não permitiram a adoção de institutos forjados para uma sociedade circundada por água e profundamente enraizados em uma mundivisão feudal, como é o caso do direito agrário (land law); "por tais razões, os institutos como a primogenitura, que é a base do sistema hereditário na Inglaterra, nunca tiveram qualquer aceitação nos Estados Unidos. Outra diferença notável é o fato de os Estados Unidos terem sido formados sob a égide da liberdade de culto religioso, em uma fase histórica em que a equity já estava laicizada nos tribunais que a aplicavam; a influência do direito declarado pelos tribunais quase eclesiásticos do Chanceler do Rei, a equity (antes ou após a Reforma anglicana), teve uma influência relativa sobre o direito norte-americano como um todo" (20).

A partir daquele referido momento, as fontes do direito americano são basicamente a Constituição, as leis ordinárias federais (US Statutes - e.g.: Uniform Commercial Code; Federal Rules of Civil Procedure) e estaduais, e as regras herdadas do common law. Embora estas sejam aplicadas em caráter subsidiário, apenas para suprir eventuais lacunas das leis escritas, possuem inequívoca relevância na atividade jurídica dos Estados Unidos.

O primeiro Law Report americano foi publicado em Connecticut, em 1789. Não demorou muito para que vários Estados regulamentassem a edição de coleções oficiais. Em outros, os próprios juízes das Courts of Appeals providenciavam a seleção e publicação por sua própria iniciativa (21).

Tenha-se presente que as normas recepcionadas durante muitos séculos não só influenciaram o direito material como, também, determinaram a adoção do procedimento decisório nos moldes do common law. Sem embargo de inúmeras adequações ao contexto institucional americano, as cortes de justiça dos Estados Unidos julgam, com vigorosa frequência, segundo os princípios da teoria do stare decisis, referido pela própria doutrina como decisional law (22).

A literatura especializada alude a determinados "superprecedentes" que, desde o início do século XIX, são consagrados pela Suprema Corte. Esses julgados encontram-se tão arraigados ("too strong and obstinate") na experiência prática dos tribunais norte-americanos que "não devem sofrer qualquer distúrbio". A propósito, Michael Gerhardt, no seu interessante livro The Power of Precedent, invoca, como clássico exemplo de um "superprecedente", Marbury v. Madison (1803), em matéria de controle incidental de constitucionalidade (23).

Ademais, cumpre, também, salientar que a praxe das cortes americanas aplica com menor rigidez a regra do binding precedent.

Summers bem explica que, em certas situações, regradas por lei (statute), eventuais precedentes detêm menor peso. Não obstante, um julgado que interpreta o texto legal passa a ter, em seguida, binding force para futuros casos análogos (24).

Verifica-se que, ainda hoje, prevalece entre os juristas norte-americanos a ideia clássica de que o sistema do common law "consiste em aplicar a razão e a experiência. Toda a teoria que daí decorre parte da suposição de que a experiência proporcionará o fundamento mais satisfatório para os standards da ação e princípios de decisão. Sustenta-se, com acerto, que o direito não pode ser criado arbitrariamente por um fiat da vontade soberana, mas, sim, descoberto pela experiência judicial e jurídica baseada em regras e princípios que, no passado, lograram alcançar uma solução justa ou fracassaram nesse intento (...)" (25).

4 Determinantes do Superamento do Precedente

Durante toda a evolução histórica da atividade judicial, a força vinculante das decisões sofreu profundas alterações, sendo correto afirmar-se que, hoje, nem mesmo a House of Lords encontra-se absolutamente adstrita às suas próprias decisões.

Aduza-se que, sob tal perspectiva, as técnicas do overruling (common law) e do revirement (civil law) representam situações específicas e excepcionais com o escopo de excluir do ordenamento jurídico determinado precedente, para substituí-lo por outro que melhor se ajuste à hipótese sub examine.

Em princípio, nos sistemas dominados pelas regras do common law, todo precedente deve ser considerado nos julgamentos futuros de casos análogos.

Schauer, discorrendo sobre a eficácia vinculante, ínsita às rules of law moldadas nos pretéritos julgamentos, assevera que, paradoxalmente, as cortes de justiça, em princípio, têm o dever de seguir o precedente não apenas quando imaginam estar ele correto, mas, ainda, quando entendem que o precedente emerge incorreto (26).

Observam, nesse mesmo sentido, Atiyah e Summers (27): "The concept of a system of precedent is that it constrains judges in some cases to follow decisions they do not agree with".

Todavia, a inexorável evolução do direito determinada pela dinâmica social dos países que se orientam pela doctrine of binding precedent permite que, em certas circunstâncias, venha oposta exceção à referida regra.

Apontando as causas de superamento de determinada tese jurídica, Patrícia Perrone Campos Mello, em sua sólida pesquisa sobre essa temática, destaca que o precedente judicial perde normalmente seu status quando: a) desponta contraditório, b) torna-se ultrapassado, c) é colhido pela obsolescência em virtude de mutações jurídicas, ou, ainda, d) encontra-se equivocado.

Assinala, a propósito, que tais fatores conduzem, em síntese, a "duas razões para se revogar um precedente: sua incongruência social e sua inconsistência sistêmica. A incongruência social alude a uma relação de incompatibilidade entre as normas jurídicas e os standards sociais, corresponde a um vínculo negativo entre as decisões judiciais e as expectativas dos cidadãos. Ela é um dado relevante na revogação de um precedente porque a preservação de um julgado errado, injusto e obsoleto até pode atender aos anseios de estabilidade, regularidade e previsibilidade dos técnicos do direito, mas aviltará o sentimento de segurança do cidadão comum". Já a ideia de inconsistência sistêmica aponta para uma desarmonia entre as diversas regras que compõem um determinado ordenamento jurídico... (28).

Com efeito, as cortes superiores podem, então, substituir - overruled - um determinado precedente por ser considerado ultrapassado ou, ainda, errado (per incuriam ou per ignorantia legis). A decisão que acolhe nova orientação incumbe-se de revogar expressamente a ratio decidendi anterior (express overruling). Nesse caso, o antigo paradigma hermenêutico perde todo o seu valor vinculante.

É possível, também, que, sem qualquer alusão ao posicionamento jurisprudencial assentado, a nova decisão siga diferente vetor. Tem-se aí, embora mais raramente, uma revogação implícita do precedente (implied overruling), similar à ab-rogação indireta de uma lei (29).

Distinguem-se, ainda, como exceção à regra do precedente vinculante:

a) a retrospective overruling: quando a revogação opera efeito ex tunc, não permitindo que a anterior decisão, então substituída, seja invocada como paradigma em casos pretéritos, que aguardam julgamento;

b) a prospective overruling: instituída pela Suprema Corte americana, na qual o precedente é revogado com eficácia ex nunc, isto é, somente em relação aos casos sucessivos, significando que a ratio decidendi substituída continua a ser emblemática, como precedente vinculante, aos fatos anteriormente ocorridos;

c) a anticipatory overruling: introduzida, com inescondível arrojo, pelos tribunais dos Estados Unidos. Consiste na revogação preventiva do precedente, pelas cortes inferiores, ao fundamento de que não mais constitui good law, como já teria sido reconhecido pelo próprio tribunal ad quem. Basta, portanto, que na jurisprudência da corte superior tenha ocorrido, ainda que implicitamente, uma alteração de rumo atinente ao respectivo precedente. Ocorre, aí, "uma espécie de delegação tácita de poder para proceder-se ao overruling" (30).

É certo que todos esses mecanismos estão a evidenciar que a força vinculante do precedente não impede que uma determinada tese dominante, antes sedimentada, possa ser superada, passando-se a um novo processo de "normatização pretoriana". A mutação progressiva de paradigmas de interpretação de um determinado episódio da vida, dotado de relevância jurídica, sempre veio imposta pela historicidade da realidade social, constituindo mesmo uma exigência de justiça...

Saliente-se que o superamento do precedente judicial, pelas mesmas razões supra-alinhadas, igualmente se observa nos sistemas de civil law.

Seja como for, acerca desse assunto, deve ter-se presente que a abrupta alteração dos rumos da jurisprudência acarreta, em regra, gravíssimas consequências no plano da dinâmica do direito, visto que: a) vulnera a previsibilidade dos pronunciamentos judiciais, e, por via de consequência, b) produz insegurança jurídica.

Desse modo, para evitar esses sérios inconvenientes é que foi instituída a denominada prospective overruling. Nesse sentido, o mecanismo da modulação dos efeitos constitui importantíssimo instrumento técnico, a ser prestigiado pelo legislador e pelos tribunais.

Ressalta, a esse respeito, Marinoni que: "quando nada indica provável revogação de um precedente, e, assim, os jurisdicionados nele depositam confiança justificada para pautar suas condutas, entende-se que, em nome da proteção da confiança, é possível revogar o precedente com efeitos puramente prospectivos, a partir do trânsito em julgado, ou mesmo com efeitos prospectivos, a partir de certa data ou evento. Isso ocorre para que as situações que se formaram com base no precedente não sejam atingidas pela nova regra (...)" (31).

Ademais, o "abandono" do precedente, sobretudo no ambiente de uma experiência jurídica dominada pelo case law, exige do órgão judicial uma carga de argumentação que supõe não apenas a explicação ordinária das razões de fato e de direito que fundamentam a decisão, mas, ainda, justificação complementar. Essa imposição natural é geralmente esclarecida pelo denominado princípio da inércia, segundo o qual a orientação já adotada em várias oportunidades deve ser mantida no futuro (por ser presumivelmente correta, pelo desejo de coerência e pela força do hábito). Não pode, pois, ser desprezada sem uma motivação satisfatória (32).

No direito norte-americano, tanto a Suprema Corte quanto os tribunais superiores dos respectivos Estados, ao longo da história, reveem seus precedentes quando manifestamente equivocados ou ultrapassados. Encontra-se expressivo exemplo da prática do overruling em uma conhecida situação em que um consumidor acionou um fabricante de automóveis visando a receber indenização por danos pessoais, resultantes de defeito no carro. O tribunal de apelação reformou a sentença de primeiro grau, eximindo o fabricante de qualquer responsabilidade em relação ao demandante, porque este não era o comprador original. O automóvel havia sido adquirido de um terceiro (33).

Ocorre que, posteriormente, por força de um writ of error (espécie de ação rescisória), a mesma corte, reexaminando a orientação que antes prevalecera e desconsiderando o caráter privado do contrato, julgou procedente o pedido de indenização, isto é, favorável ao consumidor, com fundamento em precedente do Tribunal de Apelação do Estado de New York (MacPherson v. Buick Motor Co.) (34).

5 Tipologia do Precedente na Experiência Jurídica Brasileira

Na atualidade, o direito brasileiro adota um modelo misto quanto à eficácia dos precedentes judiciais, a saber: a) precedentes com eficácia meramente persuasiva, b) precedentes com relativa eficácia vinculante e c) precedentes com eficácia vinculante(35).

a) Precedentes com eficácia meramente persuasiva

A doutrina civilista pátria de época contemporânea, claramente dominada pelos influxos do condicionamento histórico, apresenta marcante tendência de admitir apenas eficácia persuasiva aos precedentes judiciais.

Entre aqueles que cuidaram do tema, Mário Guimarães, na obra O Juiz e a Função Jurisdicional (36), foi incisivo em afirmar que a jurisprudência dos tribunais é fruto da sabedoria dos experientes: é "o conselho precavido dos mais velhos. Quem conhece a lei e ignora a jurisprudência, diz, com exagero embora, Dupliant, não conhece quase nada".

A monografia clássica de Rubens Limongi França traz um rol de "jurisprudencialistas", de ontem e de hoje, que enalteceram a posição da atividade judicial como forma de expressão do direito. Emitindo a sua própria opinião, Limongi França escreve que a regra básica, na esfera do civil law, é a de que os julgados anteriores não vinculam necessariamente o magistrado, ainda que provenham do mesmo tribunal ou de corte superior (37).

Não obstante, em caráter excepcional - conclui -, a repetição constante, racional e pacífica dos precedentes judiciais, que, nessa hipótese, forma a jurisprudência, pode efetivamente adquirir valor de preceito geral: "é, a nosso ver, quando, pela força da reiteração e, sobretudo, da necessidade de bem regular, de modo estável, uma situação não prevista, ou não resolvida expressamente pela lei, ela assume os caracteres de verdadeiro costume judiciário" (38).

Washington de Barros Monteiro, com a profunda experiência de magistrado, asseriu que, no sistema jurídico latino, menos preponderante é o papel do precedente judicial. Embora constitua ele "ótima fonte de consulta, não estão os juízes adstritos a segui-los. Por mais uniforme que seja a jurisprudência, por mais reiterados que sejam seus pronunciamentos, ela não representa norma imperativa... O único compromisso que têm os juízes é com a lei e a própria consciência. Os precedentes, que se examinam sob o aspecto da qualidade, e não da quantidade, ainda que proferidos em tempos calmos, e não de paixões, apenas constituem fontes de consulta, aliás, preciosas" (39).

Depois de sobrelevar o dilema entre a adoção da súmula vinculante e a ampliação do colégio de julgadores dos tribunais superiores, Dínio de Santis Garcia prefere deixar ao crivo destes a eleição das causas que realmente tenham interesse público digno de ser examinado em tal instância jurisdicional (40).

Considerando o papel das súmulas de jurisprudência, Miguel Reale afasta a relativa estabilidade destas dos efeitos dos binding precedents do common law e, ainda, exorta os juristas a zelar para que não se enferruje o mecanismo jurisdicional, de modo que os standards pretorianos sejam constantemente revistos, em razão de mutações supervenientes no sistema legal, ou, o que não é menos importante, por exigência de novos valores socioeconômicos e/ou culturais (41).

Realmente, entendo também que os precedentes judiciais constituem valioso subsídio que auxilia a hermenêutica de casos concretos, embora careçam de força vinculante. É importante relevar, a tal propósito, a constante possibilidade de revisão da jurisprudência sedimentada não apenas por iniciativa dos órgãos jurisdicionais, mas, igualmente, por provocação das partes interessadas.

Ademais, cabe aos magistrados outorgar aos precedentes dos tribunais superiores revestidos da marca de definitividade o valor e a influência aptos a orientar os órgãos inferiores e não desrespeitar, sem justificação plausível, a função nomofilácica àqueles atribuída pela Constituição Federal.

A despeito da inexistência de fundamento legal explícito a embasar tal raciocínio, dúvida não há de que decorre ele de nosso sistema jurídico, que não pode conviver com tamanho desvio das decisões provindas das mais altas cortes do país, justamente encarregadas pela Lei Maior a desenvolver a tarefa de controle da constitucionalidade (STF) e da legalidade infraconstitucional (STJ) (42).

Os processualistas mais ortodoxos que escreveram há algumas décadas seguiram também essa corrente de pensamento que sempre preponderou nos países de direito codificado.

Alfredo Buzaid, à luz do sistema processual civil vigente, assevera que os precedentes judiciais (exemplis), por mais prestigiados que sejam, não podem obrigar os juízes, que permanecem independentes, livres de qualquer subserviência hierárquica superior no exercício da atividade jurisdicional. E é exatamente esse aspecto que afasta a subordinação aos arestos dos altos tribunais(43).

Esta também a concepção de Roberto Rosas, ao defender que a jurisprudência é a reiteração de casos análogos passados para o rol dos fatos consumados, que apenas são passíveis de revisão por força de motivos relevantes ou de mutações nas duas origens ou fontes emanadoras: a lei ou a doutrina. Apenas nesse ponto "vislumbramos o entendimento da jurisprudência, já consolidada e incorporada aos repertórios jurisprudenciais, qual um código norteador das decisões a seguir" (44).

Hoje, a finalidade da súmula jurisprudencial, em particular do Superior Tribunal de Justiça, não é somente proporcionar maior estabilidade do direito, mas também facilitar o exercício profissional do advogado. Todavia, não se pode deixar de ter presente o seu caráter de precedente despido de eficácia normativa.

Mais recentemente, Vicente Greco Filho, ao examinar o incidente de uniformização de jurisprudência, sustenta que o precedente judicial vincula o órgão fracionário do tribunal para o julgamento do caso concreto, que deve seguir o entendimento fixado pelo plenário; no entanto, para os casos futuros, terá apenas a autoridade de um provimento já tomado e divulgado pela composição mais elevada da corte (45).

b) Precedentes com relativa eficácia vinculante ("force de facto")

Ressalte-se, sob outra perspectiva que, remodelando o antigo prejulgado, o Código de Processo Civil em vigor introduziu, nos arts. 476 a 479, o instituto da uniformização da jurisprudência, cuja instauração não constitui faculdade, mas, sim, dever do juiz.

A finalidade desse incidente processual, suscitável por qualquer juiz da turma julgadora ou por um dos litigantes, é a de provocar o prévio pronunciamento do tribunal de segundo ou superior grau acerca da interpretação de determinada tese ou norma jurídica, quando a seu respeito ocorre divergência.

Não se trata de recurso, embora constitua incidente da fase de julgamento deste, em prol do interesse público de certeza do direito, alcançada, também, pela uniformidade de entendimento judicial sobre determinada quaestio iuris.

Reconhecida a divergência, a maioria absoluta dos membros que integram o tribunal declara a interpretação a ser observada, que se transforma em súmula e passa a constituir precedente na uniformização da jurisprudência.

É até curioso assinalar que, enquanto o Supremo Tribunal Federal e, mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça editam, com destacada frequência, as suas respectivas súmulas, os tribunais regionais federais e estaduais dificilmente admitem a julgamento o incidente de uniformização de jurisprudência. É patente, nesse sentido, o infundado receio de submissão ao pensamento da maioria...

Certo é que os precedentes sumulados do Superior Tribunal de Justiça gozam de vigorosa força persuasiva (binding de facto), como, e.g., pode-se extrair de pronunciamento, exarado no Agravo Regimental em Agravo de Instrumento 428.452-MS, relatado pelo Ministro Castro Filho, in verbis: "a exigência da certidão de publicação do acórdão recorrido é entendimento pacificado não apenas neste STJ, como também no Pretório Excelso (...). Ainda que as súmulas não sejam lei em sentido formal, traduzem elas o entendimento reiterado dos tribunais no que diz respeito à interpretação de determinada questão (...)" (46).

Proferindo o voto condutor no julgamento do Recurso Especial 14.945-0-MG, concluiu o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira que, realmente, "não se justifica que os órgãos julgadores se mantenham renitentes à jurisprudência sumulada, cujo escopo, dentro do sistema jurídico, é alcançar a exegese que dê certeza aos jurisdicionados em temas polêmicos, uma vez que ninguém ficará seguro de seu direito ante jurisprudência incerta" (47).

Ademais, no modelo brasileiro vigente, tão eficaz é o precedente judicial sumulado, ou até mesmo "dominante", que, a partir da Lei nº 8.038/90 (art. 38), reiterada, sucessivamente, pelas Leis ns. 9.139/95 e 9.756/98, que deram nova redação ao art. 557 do Código de Processo Civil, qualquer recurso poderá ser liminarmente indeferido, pelo relator, quando o fundamento da irresignação colidir "com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior".

Incide, nesse caso, a denominada súmula impeditiva de recurso(48).

Cite-se, como exemplo, o julgamento do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 299.196-MG, relatado pelo Ministro Franciulli Netto, no qual ficou assentado que: "a expressão 'jurisprudência dominante do respectivo tribunal' somente pode servir de base para negar seguimento a recurso quando o entendimento adotado estiver de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, sob pena de negar às partes o direito constitucional de acesso às vias excepcionais (extraordinária e especial)" (49).

E, diagnosticada tal situação, ou seja, interposto recurso contra tese sumulada ou orientação assentada, "impõe-se a aplicação da multa de que trata o art. 557, § 2º, do Código de Processo Civil, arbitrada em 1% (um por cento) sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor" (50).

Mas não é só. O § 1ºA do mesmo art. 557 dispõe que, se porventura "a decisão recorrida estiver em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Superior Tribunal Federal ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso".

Ressalte-se que, nessa derradeira hipótese, os efeitos ("quase") vinculantes do precedente judicial, sumulado ou dominante(51), chegam até a autorizar que decisão monocrática substitua o tradicional julgamento colegiado de segundo grau!

O precedente judicial, consagrado em súmula, adquire, assim, a dignidade que flui do elevado órgão de que emana, embora "não a autoridade intrínseca de fonte do direito" (52), porque apenas revela o sentido da lei. A súmula "não cria, não inova, não elabora lei; cinge-se a aplicá-la, o que significa que é a própria voz do legislador" (53).

A teor do art. 124 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, a jurisprudência sumulada dispensa o recorrente de invocar precedentes judiciais em abono de seu direito.

Insta observar, por outro lado, que o ideal de uniformizar a interpretação e a aplicação do direito brasileiro irrompe realmente determinado, pelo fato de que o legislador brasileiro, ao lado daquele já existente, introduziu nova espécie de mecanismo visando a unificar a jurisprudência no âmbito de um mesmo tribunal.

Com efeito, inovando nessa matéria, a Lei nº 10.352/01 inseriu o § 1º no texto do art. 555 do Código de Processo Civil, com a seguinte redação: "ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor divergência entre câmaras ou turmas do tribunal, poderá o relator propor seja o recurso julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar; reconhecendo o interesse público na assunção de competência, esse órgão colegiado julgará o recurso".

Dois são, como se observa, os pressupostos para a instauração do incidente, a ser provocado exclusivamente pelo relator do recurso: a) possibilidade de divergência ou verificação da existência da mesma e b) interesse público.

O propósito dessa alteração, consoante justificativa da Exposição de Motivos do Projeto da Câmara dos Deputados nº 3.474/00, que se converteu na aludida Lei, é o de que a técnica instituída emerge consagrada nos arts. 14, II, e 12, parágrafo único, II, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, permitindo a "remessa do recurso a um colegiado maior, buscando compor ou prevenir divergência entre Turmas ou Câmaras em relevante questão de direito. Tal colegiado julgará plenamente o recurso, e a decisão, em consequência, irá impor-se como precedente jurisprudencial a ser tomado em conta pelo tribunal nos subsequentes julgamentos sobre a mesma matéria".

Aduz mais: "Essa sistemática supera, com grande vantagem técnica operacional, a do instituto da uniformização de jurisprudência, de limitadíssimo emprego em nossa prática forense. Diga-se que igualmente o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal prevê, nesses casos, possa a Turma transferir ao Plenário a competência para o julgamento do feito - art. 22, parágrafo único, alíneas a e b. Nada mais adequado, destarte, que permitir, também no âmbito dos tribunais de segundo grau, o uso dessa faculdade, com manifesto proveito ao superior interesse dos jurisdicionados na estabilidade jurídica que uma jurisprudência uniformizadora propicia".

Infere-se de logo o alto custo que tem sido pago pela determinação do legislador de época contemporânea, que não mede esforços em busca de mecanismos tendentes a trancar demandas judiciais em seu nascedouro. Conquanto deva ser reconhecido o espírito louvável que anima o propósito dos responsáveis pela reforma processual então introduzida, entendemos que tal alteração revela patente desconhecimento da realidade de nossos tribunais regionais quanto à disposição da maioria de seus integrantes em unificar os precedentes judiciais.

Em primeiro lugar, deve ser anotado que, pela ótica da segurança jurídica, qualquer divergência de entendimento dentro de um mesmo tribunal passa a ter interesse público. Só por essa razão já se infere a prevalência da tradicional técnica de uniformização sobre esta agora instituída.

Ressalte-se, outrossim, que o art. 476 do Código de Processo Civil, reconhecendo o interesse de todos os protagonistas do processo em evitar o dissídio pretoriano, outorga legitimidade a qualquer um dos juízes componentes do órgão colegiado, bem como às partes, para suscitar o respectivo incidente.

Ademais, o julgamento em duas fases subsequentes, denominado subjetivamente complexo, uma perante o pleno ou órgão especial do tribunal, destinada a fixar a tese atinente à quaestio iuris, e outra, diante do órgão fracionário suscitante do incidente, que detém a competência para ultimar o julgamento no caso concreto, constitui outro importante fator, característico do procedimento da uniformização de jurisprudência já consagrado no Código de Processo Civil, que supera em muito, sob o aspecto técnico, aquele que restou aprovado em 2001.

Enquanto o incidente processual regrado nos arts. 476 a 479 conduz à pacificação do entendimento sobre tese jurídica que integra a competência material de determinado pretório, o mecanismo introduzido preocupa-se apenas com a solução de um caso isolado. (54)

Seja como for, a atual sistemática passou a coexistir com o tradicional instituto da uniformização da jurisprudência.

Cumpre, ainda, acrescentar que, consoante o disposto no art. 546 do Código de Processo Civil, é cabível o recurso de embargos de divergência contra acórdão de turma, do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, que conflite com provimento de outro órgão fracionário da mesma corte.

Inspirados, por certo, no recurso de revista do direito anterior, esses embargos têm, também, por finalidade a uniformização intra muros dos julgados dos referidos tribunais.

c) Precedentes com eficácia vinculante

Hoje, no Brasil, detêm eficácia vinculante:

i) as súmulas do Supremo Tribunal Federal;

ii) as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal e pelos Tribunais de Justiça, no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade; e

iii) as decisões proferidas no incidente de processos repetitivos.

A Emenda Constitucional nº 45/04 inseriu, no texto da Constituição Federal, o art. 103-A, que outorga ao Supremo Tribunal Federal a atribuição de aprovar súmula com eficácia vinculante vertical. A superveniente Lei nº 11.417/06 regulamentou o respectivo procedimento referente à súmula vinculante.

Por meio de iniciativa dos próprios integrantes do Supremo Tribunal Federal ou mediante requerimento dos legitimados, as súmulas poderão ser aprovadas por dois terços dos ministros e desde que se trate de matéria constitucional sobre a qual haja reiterados pronunciamentos, por certo, em sentido convergente.

A expressão "reiterados pronunciamentos", dada a sua evidente imprecisão, deverá ser interpretada a partir da existência de alguns precedentes uniformes sobre determinada questão. A análise objetiva da Suprema Corte é que irá estabelecer se a validade, a interpretação e os efeitos de uma quaestio iuris, de natureza constitucional, já se encontram suficientemente consolidados, a ponto de ser alçada à categoria de precedente sumulado.

O § 1º do art. 103-A traça, como pressuposto para a instauração do "procedimento de elaboração da súmula", a existência de "controvérsia atual" acerca de certa norma de conteúdo constitucional entre órgãos judiciários inferiores, ou entre estes e a administração pública, que possa colocar em crise a segurança jurídica e que redunde em significativa multiplicação de demandas similares.

Sendo aprovada, a eficácia da tese jurídica sumulada projetar-se-á, com força vinculante, a todos os demais órgãos jurisdicionais, de quaisquer instâncias, inclusive no âmbito da administração pública direta e indireta, em todos os níveis da federação.

Atribui-se, outrossim, ao próprio Supremo Tribunal Federal, no caput do mesmo art. 103-A, a faculdade de revisão ou cancelamento da regra sumulada, "na forma estabelecida em lei".

Preceitua, a propósito, o § 2º do aludido dispositivo que: "sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento da súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade".

Cumpre destacar que se autoriza expressamente, como se observa, a possibilidade de revisão ou mesmo de revogação da regra sumulada. Não é preciso dizer que, do contrário, ou seja, sem essa flexibilidade, haveria o perigo de estagnação da jurisprudência, "que não convém a sistema algum. O mais nobre dos predicados do chamado direito jurisprudencial é a sua capacidade de adaptar-se às mutações sociais e econômicas da nação, de modo a extrair dos textos constitucionais e legais a norma que no momento atenda aos reclamos axiológicos da sociedade" (55).

Anote-se, por outro lado, que, desde o advento da República, na esteira do modelo norte-americano, adotou-se no Brasil o controle difuso, por via incidental, outorgando-se competência a qualquer órgão do Poder Judiciário para conhecer, incidente e prejudicialmente, a questão da inconstitucionalidade.

Editada a Constituição de 16 de julho de 1934, todavia, passou-se a admitir o controle concentrado, direto, por via principal, ainda que bem limitado.

A suprarreferida Emenda Constitucional nº 45/04, alterando a redação do art. 103 da Constituição Federal, unificou a legitimação ativa para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade e da ação declaratória de constitucionalidade. Hoje estão legitimados: a) o Presidente da República, b) a Mesa do Senado Federal, c) a Mesa da Câmara dos Deputados, d) a Mesa da Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, e) o Governador de Estado ou do Distrito Federal, f) o Procurador-Geral da República, g) o Conselho Federal da OAB, h) o partido político com representação no Congresso Nacional e i) a confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

É bem de ver que, no plano federal, a competência para o controle jurisdicional de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual continua especificada, com exclusividade, ao Supremo Tribunal Federal, a quem também compete processar e julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, contemplada no art. 103, § 2º, quando a norma legal que deveria ter sido regulamentada pelo legislador ordinário, e não o foi, estiver contida na Constituição Federal e, ainda, a arguição de descumprimento de preceito fundamental, a teor do disposto no art. 102, § 1º.

Ressalte-se, outrossim, que a Emenda Constitucional nº 3/93, além de inúmeras modificações na ordem tributária, introduziu no art. 102, inciso I, da Constituição Federal a denominada ação declaratória de constitucionalidade, de competência originária do Supremo Tribunal Federal.

Importa notar que essa aludida reforma, no § 2º do art. 102, determinou, ainda, que: "as decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações declaratórias de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e ao Poder Executivo".

Observa-se, assim, que a primordial razão política inspiradora do Legislativo federal foi, sem dúvida, a de instituir um mecanismo destinado a subordinar o desfecho de demandas em curso perante juízos inferiores - monocráticos e colegiados - à decisão do Excelso Pretório pátrio.

O procedimento da referida ação declaratória de constitucionalidade somente foi regulamentado pela Lei nº 9.868, de 1999, que também disciplinou aquele da tradicional ação direta de inconstitucionalidade.

Pois bem, verifica-se que esse diploma legal acabou ampliando de modo expressivo a eficácia vinculante dos precedentes do Supremo Tribunal Federal no tocante ao controle direto da constitucionalidade das leis. Abriu-se, assim, a passos largos, o caminho de adoção, no Brasil, do precedente judicial com força vinculante em situações em que se encontram em jogo importantes quaestiones iuris, de inequívoco peso político.

Dispõe, a respeito, o art. 28 da referida Lei nº 9.868 que: "dentro do prazo de 10 (dez) dias após o trânsito em julgado da decisão, o Supremo Tribunal Federal fará publicar em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do acórdão. Parágrafo único. A declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal".

Procurando imprimir certeza jurídica nessa matéria, o respectivo acórdão delineia-se irrecorrível, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória (art. 26). Produz coisa julgada material, que vincula as autoridades aplicadoras da lei, que não mais poderão dar-lhe execução sob pena de afrontar a res iudicata, "uma vez que a declaração de inconstitucionalidade em tese visa precisamente a atingir o efeito imediato de retirar a aplicabilidade da lei. Se não fosse assim, seria praticamente inútil a previsão constitucional de ação direta de inconstitucionalidade genérica" (56).

Cumpre, ainda, acrescentar que a Lei nº 9.882/99, que regulamentou o processo e o julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental, seguindo a mesma diretriz dos já aludidos mecanismos de controle direito da constitucionalidade da lei, determina, no art. 10, § 3º, que, em caso de procedência do pedido, "a decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público".

Não há dúvida, outrossim, de que a força vinculante erga omnes, suprarreferenciada, acentua o caráter de fonte de direito dos precedentes judiciais do Supremo Tribunal Federal.

Como bem pontuado, a propósito, a imutabilidade do conteúdo das decisões sobre a constitucionalidade dos textos legais, prevista expressamente no ordenamento jurídico, alça a produção da atividade judicial, em sistemas em que esta ocupa preeminente posição, ao mesmo nível da hierarquia da lei (57).

Por fim, visando, ainda uma vez, a combater a morosidade da justiça, a Lei nº 11.672/08 inseriu o art. 543-C no Código de Processo Civil, criando o denominado incidente de processos repetitivos, ao dispor: "quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo".

No que ora interessa, verifica-se que, a teor dos incisos I e II do § 7º do referido art. 543-C, publicado o acórdão proferido num determinado recurso especial, os recursos especiais com o respectivo procedimento sobrestado na corte de origem "terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou serão novamente examinados pelo Tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça".

Verifica-se que, sobretudo na primeira das situações delineadas no inciso I, o julgamento colegiado proferido pelo Superior Tribunal de Justiça determina, com inequívoca força vinculante, a inadmissibilidade do recurso especial, que teve seu procedimento sobrestado.

6 Interpretação do Precedente Judicial

Delineia-se notável o aperfeiçoamento técnico de interpretação do precedente judicial, desenvolvido desde há muito pelos juristas do sistema do common law.

Pondera Galgano que o jurista continental ainda não está aparelhado - nem cultural nem tecnicamente - para lidar com a jurisprudência, ou melhor, com a ciência da interpretação da produção judiciária. Daí a necessidade de buscarmos os valiosos subsídios daquela experiência jurídica (58).

A ratio decidendi, como já observado, constitui a essência da tese jurídica suficiente para decidir o caso concreto (rule of law). É essa regra de direito (e, jamais, de fato) que vincula os julgamentos futuros inter alia.

Sob o aspecto analítico, três são os elementos que a integram: a) a indicação dos fatos relevantes (statement of material facts), b) o raciocínio lógico-jurídico da decisão (legal reasoning) e c) o juízo decisório (judgement) (59).

Cumpre esclarecer que a ratio decidendi não é pontuada ou individuada pelo órgão julgador que profere a decisão. Cabe aos juízes, em momento posterior, ao examinarem-na como precedente, extrair a "norma legal" (abstraindo-a do caso) que poderá ou não incidir na situação concreta.

A submissão ao precedente, comumente referida pela expressão stare decisis, indica o dever jurídico de conformar-se às rationes dos precedentes (stare rationibus decidendi). A ratio decidendi encerra uma escolha, uma opção hermenêutica de cunho universal, "e repercute, portanto, sobre todos os casos futuros aos quais tenha ela pertinência: assim, o vínculo do stare decisis distingue-se do dever de respeito à res iudicata (que é a disciplina do caso concreto)" (60).

Frise-se que a literatura é enfática em acentuar esse caráter de "universalidade" da justificação das decisões judiciais (61).

É, certamente, em decorrência desse relevante aspecto, na órbita de um sistema jurídico estribado na observância compulsória dos precedentes, que as razões de decidir devem prever e sopesar a repercussão prática que determinada decisão poderá oferecer para o ordenamento jurídico globalmente considerado.

Não se afasta, até, a possibilidade de haver, em algumas ocasiões, um efetivo "receio judicial" de inclinar-se por determinada vertente (e, portanto, de potenciar a criação de precedente), que será seguida em grande número de decisões: "ides decidir, não a respeito de Isócrates, mas a respeito de uma regra de vida, se é mister filosofar" (62).

As cortes britânicas, sob tal perspectiva, pautam-se sempre "by a consequentialist reasoning", valorando, na fundamentação, qual solução "faz melhor sentido como um comando legal de abrangência geral" (63).

Denominada de holding na linguagem dos operadores americanos, a ratio decidendi, para potenciar força obrigatória pamprocessual, deve, pois, possuir um grau de generalização em relação ao próprio caso julgado.

Para a correta inferência da ratio decidendi, propõe-se uma operação mental, mediante a qual, invertendo-se o teor do núcleo decisório, se indaga se a conclusão permaneceria a mesma se o juiz tivesse acolhido a regra invertida. Se a decisão ficar mantida, então a tese originária não pode ser considerada ratio decidendi; caso contrário, a resposta será positiva (64).

Como regra necessária à decisão, não se confunde com o obiter dictum, vale dizer, passagem da motivação do julgamento que contém argumentação marginal ou simples opinião, prescindível para o deslinde da controvérsia (65). O obiter dictum, assim considerado, não se presta para ser invocado como precedente vinculante em caso análogo, mas pode perfeitamente ser referido como argumento de persuasão.

Na verdade, os dicta, a despeito de não possuírem qualquer autoridade para predeterminar futuros julgamentos, gozam de valor persuasivo, diretamente proporcional ao prestígio da corte que os expressa; uma eficácia, em suma, equiparável ao labor de cunho doutrinário (66).

Acrescente-se, de outra parte, que se delineia possível aos juízes ingleses, em particular, aos membros da House of Lords, emitirem opinions ou speeches individuais, e que são igualmente publicados nos Law Reports. Tal prática acarreta, com efeito, situações muitas vezes inusitadas e que convidam à reflexão.

Pode ocorrer, por exemplo, que a corte esteja de acordo com a solução a ser dada em determinada causa, mas apresente divergência no legal reasoning, ou seja, na fundamentação jurídica. Qual então seria o princípio vinculante que prevaleceria nesse precedente?

É certo que reasons unânimes dão vida a uma única ratio decidendi. No entanto, pontos de vista convergentes no dispositivo e discordantes na motivação, quando compatíveis em relação ao tema debatido, proporcionam ao intérprete a possibilidade de escolha por uma das duas posições, sendo até passível de ser invocada a posteriori.

Já a situação inversa, ou seja, quando a fundamentação divergente descortina-se incompatível, tem-se uma decisão despida de discoverable ratio, e, portanto, não vinculante no que concerne à solução dada ao caso. Nessa hipótese, as opinions podem até gozar de algum valor, dependendo do prestígio pessoal do juiz que a emitiu (67).

Esses votos divergentes, em algumas situações, também acabam destacando as fissuras da interpretação do paradigma consolidado e, de certo modo, sinalizam possível mudança na apreciação posterior de questão semelhante.

No sistema jurídico do common law, o órgão jurisdicional, após examinar o mérito (assim entendido, o thema decidendum) da questão que lhe é submetida, parte de um processo mental indutivo e empírico, cotejando (distinguishing) o caso a ser julgado com a ratio decidendi de casos já solucionados. Raciocina-se, pois, do particular para o geral.

A complexa atividade lógica de interpretação do precedente judicial vale-se, assim, do método de confronto, denominado distinguishing, pelo qual o juiz verifica se o caso em julgamento pode ou não ser considerado análogo ao paradigma.

Assim, o precedente, para produzir eficácia vinculante, deve guardar absoluta pertinência substancial com a ratio decidendi do caso sucessivo, ou seja, deve ser considerado um precedent in point.

Esse referido processo de "distinção", dependendo das circunstâncias, implica dois tipos de atividade dos tribunais: criadora e legislativa. O tribunal pode decidir "um caso de forma contrária à solução dada em um precedente, por meio de interpretação restritiva da regra extraída do precedente em cotejo com o caso sob apreciação. Descobre-se aí alguma diferença juridicamente relevante entre os elementos estruturais dos dois casos. Ao acompanhar um precedente, por outro lado, o tribunal pode afastar um ponto, entendendo que tal aparente exceção não encontra qualquer óbice no ordenamento jurídico. Amplia-se, destarte, a regra do precedente. A despeito dessas duas formas de atividade legislativa deixadas em aberto pela eficácia vinculante do precedente, a praxe do sistema do common law produziu, ao longo do tempo, um corpo de princípios, dos quais um número significativo, quer de maior, quer de menor importância, delineia-se tão preciso como qualquer regra legislada" (68).

Infere-se, daí, a relevância que ostenta, no sistema do case law, a interpretação do precedente judicial no cotejo com o caso concreto. A lógica jurídica, nesse particular, tem como pressuposto o método de "reasoning from case to case".

Em primeiro lugar, o juiz do common law deve aproximar os elementos objetivos que possam identificar a demanda em julgamento com eventual ou eventuais decisões anteriores, proferidas em casos análogos. Procede-se, em seguida, ao exame da ratio decidendi do precedente. Dependendo da postura do juiz, pode este ser interpretado de modo restritivo (restrictive distinguishing) ou ampliativo (ampliative distinguishing).

Isso significa que não se exige submissão "cega" a anteriores decisões. Permite-se à "corte estender um princípio mais além dos limites de um caso antecedente se entender que assim estará promovendo justiça. Caso a aplicação do princípio, entretanto, possa produzir resultado indesejável, o tribunal estreitará ou restringirá o princípio, ou ainda aplicará precedente diverso". Por essa razão, deve ser assinalado que stare decisis não é apenas uma teoria que historicamente resguardou a estabilidade e a uniformidade, visto que suas restrições e ampliações inerentes, bem como os fatores que determinaram a inaplicabilidade de precedentes judiciais, permitem a inafastável flexibilidade do ordenamento do common law, indispensável à evolução e ao progresso do direito (69).

Na questão Peabody Fund v. Sir Lindsay Parkinson Ltd. (1984), a House of Lords interpretou de forma restritiva o precedente Anns v. Merton London Borough (1978). O caso Anns é citado como paradigma para as situações em que se imputa responsabilidade ao município por negligência na fiscalização de obras. No caso Peabody Fund, procurando circunscrever o dever do poder público de proteger os cidadãos ameaçados de dano à saúde ou à segurança, a House of Lords limitou a responsabilidade do município. Assim, a corte não admitiu a ação do proprietário da casa em construção, que alegara prejuízo pela falta de fiscalização no sistema de drenagem, instalado em desacordo com o projeto aprovado. Desse modo, no Peabody Fund, o elemento de distinção restritiva foi a inserção do requisito "possibilidade de dano à saúde ou à segurança".

Como exemplo de interpretação mais extensiva da tese jurídica (ratio) encampada pelo precedente, a doutrina alude à reiterada aplicação em hipóteses sucessivas do expressivo caso Barwick v. The English Stock Bank (1886), atinente à responsabilidade de entidade financeira pelo fato de um preposto ter induzido o demandante, cliente do banco, a aceitar uma garantia despida de valor, prestada por um terceiro, devedor do banco, para lastrear empréstimo que lhe fora concedido pelo referido cliente, com o qual quitou o seu débito. O núcleo da ratio decidendi centrou-se na seguinte argumentação: "no que concerne à questão de saber se um comitente é responsável por ato de seu agente, na execução de negócio realizado no interesse daquele, não se deve fazer qualquer distinção entre a fraude ou qualquer outro ilícito. A regra geral é a de que o comitente é responsável por qualquer ilícito do preposto ou do agente enquanto efetivado na execução do serviço e no interesse do comitente, mesmo que não fique provada qualquer ordem ou solicitação deste".

Em situação posterior, ou seja, no caso Lloyd v. Grace, Smith and Co. (1912), no qual um bancário, cumprindo o seu trabalho, fraudou o autor da demanda em seu próprio benefício, a Suprema Corte inglesa, entendeu aplicável o precedente Barwick v. The English Stock Bank, como se tratasse de caso absolutamente análogo, permitindo abstrair-se da expressão constante da decisão "no interesse do comitente", uma vez que a considerou como mero obiter dictum (alusão incidental) e, portanto, não um elemento essencial da ratio decidendi do precedente invocado (diversamente, aliás, da orientação que prevalecera perante a Court of Appeal) (70).

Essa aparente discricionariedade das cortes inglesas vem delimitada pelo substrato cultural latente de seus componentes e pelo dever de justificar as razões da aplicação ou da rejeição de um certo precedente, a exemplo do que ocorre na esfera do direito codificado, no qual também o julgador deve declinar os motivos pelos quais afastou-se de determinado texto legal (71).

Anote-se, por outro lado, que, quando o juiz se depara com uma questão pela primeira vez (first impression), sem que tenha existido a respeito prévia discussão pelos tribunais, considera-se um hard case (em contraposição aos clears cases, ou seja, amparados por precedentes). Os juízes terão, então, de enfrentar o mérito da controvérsia, deixando, nessa situação, de buscar subsídios imediatos nos Law Reports.

A interpretação do precedente aproxima-se da interpretação da lei, porque sempre haverá um contexto de justificação a legitimar a decisão pleiteada (72).

A peculiaridade da incidência do precedente em cotejo com a aplicação da lei consiste, sobretudo, na amplitude da área de discricionariedade que os juízes possuem. A individuação da ratio decidendi é uma operação heurística de natureza casuístico-indutiva, pela qual a regra jurídica é extraída do confronto entre a anterior decisão e o caso concreto submetido à apreciação judicial.

A sentença do juiz do civil law, a seu turno, também pressupõe um labor intelectual, porém de cunho normativo-dedutivo, no qual deve ser apresentada uma justificação das circunstâncias fáticas e jurídicas que determinaram a subsunção destes a determinado texto de lei.

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Notas

(1)Esclareça-se, de logo, que a locução "precedente judicial", sob o ponto de vista técnico-processual, significa "a decisão individualizada de um caso concreto", da qual se extrai uma tese jurídica que constitui o cerne do respectivo provimento, ou seja, a denominada ratio decidendi, prestando-se a predeterminar ou apenas nortear futuros julgamentos sobre idêntica questão (cf., a respeito da ambiguidade e polissemia da expressão "precedente judicial", Pierluigi Chiassoni, Il precedente giudiziale: tre esercizi di disincanto, Analisi e diritto, Firenze, 2004, p. 77 e segs.).

(2)Robert Alexy e Ralf Dreier, Precedent in the Federal Republic of Germany, Interpreting precedents, obra coletiva dir. por D. Neil MacCormick e Robert S. Summers, Aldershot, Ashgate, 1997.

(3)Il negozio giuridico, 2. ed., Milano, Giuffrè, 2002.

(4)Estampado no periódico dirigido por Galgano, Contratto e impresa, v. 3, Padova, Cedam, 2000, p. 1.081-1.085.

(5)Cf. Larenz, Metodologia da ciência do direito, 3. ed., trad. port. José Lamego, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, p. 615.

(6)Taruffo, Dimensioni del precedente giudiziario, Scintillae iuris: Studi in memoria di Gino Gorla, t. 1, Milano, Giuffrè, 1994, p. 387; Francesco Galgano, Il precedente giudiziario in civil law, Atlante di diritto privato comparato, Bologna, Zanichelli, 1999, p. 31.

(7)V., p. ex., Robert Alexy e Ralf Dreier, Precedent in the Federal Republic of Germany, Interpreting precedents, obra coletiva dir. por D. Neil MacCormick e Robert S. Summers, cit., p. 26.

(8)Precedent in Italy, Interpreting precedents, cit., p. 159.

(9)Thinking like a Lawyer, 1. reed. indiana, Nova Deli, Universal, 2010, p. 68-69.

(10)The history of the common law of England, Chicago, Chicago University, 1971, p. 45.

(11)Commentaries on the laws of England, v. 1, ed. comemorativa da 9. ed., London, Cavendish, 2001, p. 51-52: "(...) For if it be found that the former decision is manifestly absurd or injust, it is declared, not that such a sentence was bad law, but that it was not law; that is, that it is not the established custom of the realm, as has been erroneously determined (...)".

(12)V., e.g., Jones v. Randall (1774). Consulte-se, a propósito, Jim Evans, change in the doctrine of precedent during the nineteenth century, Precedent in law, obra coletiva ed. por Laurence Goldstein, Oxford, Clarendon, 1991, p. 36-38.

(13)Cf. Luisa Antoniolli Deflorian, Il precedente giudiziario come fonte di diritto: l'esperienza inglese, Rivista di Diritto Civile, 39, 1993, p. 156.

(14)Luisa Antoniolli Deflorian, Il ruolo del precedente giudiziale del common law inglese, Il valore dei precedenti giudiziali nella tradizione europea, obra coletiva dir. por Umberto Vincenti, Padova, Cedam, 1998, p. 193-194.

(15)Precedent in english and continental law and case law: a short replication, Law Quartely Review, 50(1934):61, nt. 25.

(16)Mirehouse v. Rennell (1833). V., a respeito, Jim Evans, Change in the doctrine of precedent during the nineteenth century, cit., p. 64; Deflorian, Il precedente giudiziario come fonte di diritto: l'esperienza inglese, cit., p. 155-156.

(17)Eis a ementa do julgado: "LONDON TRAMWAYS COMPANY V. LONDON COUNTY COUNCIL. Prática. Decisão da House of Lords. Até que ponto é vinculante para a House. Uma decisão da House of Lords sobre uma questão de direito é definitiva e vincula a House nos casos sucessivos. Uma decisão errada somente pode ser revista mediante uma lei do Parlamento".

(18)Cf. David F. Pugsley, L'origine della regola stare decisis nella House of Lords e il caso London Tramways (1898), trad. it. Luisa Antoniolli Deflorian, Il valore dei precedenti giudiziali nella tradizione europea (obra coletiva dir. Umberto Vincenti), cit., p. 242-244. É interessante notar que o articulista procura "corrigir" a expressão for some centuries, que poderia estar realmente errada na transcrição do julgamento, avançando a hipótese de que o correto teria sido for some seventy years.

(19)V., a respeito da organização judiciária inglesa depois da reforma do século XIX, Peter Stein, I precedenti nella "common law", na obra coletiva Legge, giudici, giuristi, Milano, Giuffrè, 1982, p. 55.

(20)Guido Fernando Silva Soares, Common law: introdução ao direito dos EUA, 2. ed., São Paulo, RT, 2000, p. 59.

(21)John Philip Dawson, The oracles of the law, Ann Arbor, W. S. Hein, 1986 (reed.), p. 85-86.

(22)Geoffrey C. Hazard e Michele Taruffo, American Civil Procedure: an introduction, New Haven, Yale University, 1993, p. 37 (= La giustizia civile negli Stati Uniti, Bologna, Mulino, 1993, p. 47).

(23)New York, Oxford University, 2008, p. 178-179.

(24)Precedent in the United States (New York State), Interpreting precedents, obra coletiva cit., p. 365.

(25)Cf. Roscoe Pound, El espíritu del "common law", trad. esp. José Puig Brutau, Barcelona, Bosch, s/d., p. 182.

(26)Frederick Schauer, Thinking like a lawyer, cit., p. 41.

(27)Form and substance in anglo-american law, Oxford, Clarendon, 2002 (reed.), p. 121.

(28)Patrícia Perrone Campos Mello, Precedentes, Rio de Janeiro, Renovar, 2008, p. 237 ss.

(29)Anote-se que a Court of Appeal, por exemplo, não tem a prerrogativa de revogar implicitamente as suas próprias decisões. Se porventura proferir julgamento substancialmente divergente de anterior pronunciamento, em caso análogo, sem manifestar a intenção clara de revogar o precedente, será criada uma duplicidade de orientações, gerando evidente incerteza para as cortes inferiores, até que a House of Lords intervenha para fixar qual ratio decidendi deve prevalecer (G. Moretti, La dottrina del precedente giudiziario nel sistema inglese, Contratto e impresa, obra coletiva dir. F. Galgano, Padova, Cedam, 1990, p. 57).

(30)Sartor, Precedente giudiziale, Contratto e impresa, obra coletiva dir. por F. Galgano, Padova, Cedam, 1995, p. 1.345-1.346; Moretti, La dottrina del precedente giudiziario nel sistema inglese, cit., p. 56-57.

(31)Luiz Guilherme Marinoni, Eficácia temporal da revogação da jurisprudência consolidada dos tribunais superiores, Revista dos Tribunais, 906(2011):259.

(32)Cf. Perelman e Olbrechts-Tyteca, Tratado da argumentação: a nova retórica, trad. port. Maria Ermantina Galvão Gomes Pereira, São Paulo, Martins Fontes, 2002, p. 120: "A inércia permite contar com o normal, o habitual, o real, o atual, e valorizá-lo, quer se trate de uma situação existente, de uma opinião admitida ou de um estado de desenvolvimento contínuo e regular. A mudança, em compensação, deve ser justificada; uma decisão, uma vez tomada, só pode ser alterada por razões suficientes"; Marina Gascón Abellán, La técnica del precedente y la argumentación racional, Madrid, Tecnos, 1993, p. 40.

(33)Johnson v. Cadillac Motor Co. V., a respeito, Benjamin Nathan Cardozo, A natureza do processo judicial, 3. ed., trad. port. Lêda Boechat Rodrigues, Porto Alegre, Ajuris, 1978, p. 146-147.

(34)Anote-se que esse precedente judicial foi também invocado pelo Lord Atkin, perante a House of Lords, e é considerado o leading case em matéria de responsabilidade aquiliana, no qual se anteviu a inconsistência do princípio da relatividade dos efeitos contratuais. Procurando explicar a filosofia dessa possibilidade inerente de "reforma do precedente", vale transcrever trecho de magnífica página da clássica obra de Benjamin Cardozo (Juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos, de 1932 a 1938), na qual se reporta a passagem de Monroe Smith: "(...) O common law não opera com verdades preestabelecidas, de validade universal e inflexível, para chegar a conclusões derivadas delas, por um processo dedutivo. Seu método é indutivo e ela extrai as suas generalizações de particulares. Esse processo foi admiravelmente fixado por Monroe Smith: 'Em seus esforços para dar ao sentimento social de justiça expressão articulada em regras e em princípios jurídicos, o método dos profissionais na pesquisa do direito sempre foi experimental. As regras e princípios do direito consuetudinário (case-law) nunca foram tratados como verdades finais, mas como hipóteses de trabalho, continuamente reexaminadas nesses grandes laboratórios do direito que são os tribunais de justiça. Cada caso novo é uma experiência; e se as regras aceitas, provavelmente aplicáveis, conduzem a resultado que se sente injusto, a regra é reconsiderada. Pode não ser modificada imediatamente, pois a tentativa de fazer absoluta justiça em cada caso concreto tornaria impossível o desenvolvimento e a manutenção de regras gerais; mas se continua a produzir injustiças, será eventualmente reformulada' (...)" (A natureza do processo judicial, cit., p. 59-60).

(35)V., em senso análogo, Patrícia Perrone Campos Mello, Precedentes, cit., p. 104-105.

(36)Rio de Janeiro, Forense, 1958, p. 327.

(37)O direito, a lei e a jurisprudência, São Paulo, RT, 1974, p. 175.

(38)Cf. Rubens Limongi França, O direito, a lei e a jurisprudência, cit., p. 178-179; Jurisprudência, Enciclopédia Saraiva do Direito, 47(1980):167.

(39)Da jurisprudência, Revista Forense, 202(1963):374.

(40)Efeito vinculante dos julgados da Corte Suprema e dos tribunais superiores, Revista dos Tribunais, 734(1996):46.

(41)Fontes e modelos do direito, São Paulo, Saraiva, 1994, p. 72.

(42)Cf., nesse sentido, Edgard Silveira Bueno Filho, Os precedentes no direito brasileiro, Revista dos Tribunais, 716(1995):26.

(43)Alfredo Buzaid, Uniformização da jurisprudência, Ajuris, 34(1985):211.

(44)Roberto Rosas, Direito sumular, Revista Jurídica Lemi, 148(1980):44.

(45)Direito processual civil brasileiro, v. 2, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 1996, p. 374-375.

(46)Terceira Turma, DJU 05.08.02.

(47)Quarta Turma, DJU 13.04.92.

(48)Cf. Roberto Rosas, Direito sumular, 11. ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 10. V., criticando o sistema adotado, Lenio Luiz Streck, Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2002, p. 403-405.

(49)Segunda Turma, DJU 05.08.02.

(50)STJ, Quinta Turma, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 468.637-PI, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU 02.12.02.

(51)Em diversas ocasiões, criticando a infeliz expressão jurisprudência dominante, tivemos a oportunidade de questionar qual teria sido a verdadeira intenção do legislador: jurisprudência qualitativa ou quantitativamente dominante?...

(52)Oliveira Ascensão, O direito: introdução e teoria geral - uma perspectiva luso-brasileira, 11. ed., Coimbra, Almedina, 2001, p. 317, nt. 476.

(53)Cf. Buzaid, Uniformização da jurisprudência, Ajuris, 34, cit., p. 215.

(54)V., apontando também a incontestável superioridade do instituto previsto na legislação em vigor, José Marcelo Menezes Vigliar, Uniformização de jurisprudência: segurança jurídica e dever de uniformizar, São Paulo, Atlas, 2003, p. 194-195.

(55)Cf. Dinamarco, Súmulas vinculantes, Revista Forense, 347(1999):64.

(56)Cf. José Afonso da Silva, Curso de direito constitucional positivo, 16. ed., São Paulo, Malheiros, 1999, p. 56-57.

(57)Julio Cueto Rua, Fuentes del derecho, Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1994, p. 169; Cruz e Tucci, Precedente judicial como fonte do direito, São Paulo, RT, 2004, p. 275.

(58)Francesco Galgano, L'interpretazione del precedente giudiziario, Contratto e impresa, obra coletiva dir. por Galgano, Padova, Cedam, 1985, p. 701.

(59)Luisa Antoniolli Deflorian, Il ruolo del precedente giudiziale del common law inglese, Il valore dei precedenti giudiziali nella tradizione europea, cit., p. 182.

(60)Sartor, Precedente giudiziale, cit., p. 1.321. Cf., também, Teresa Wambier, Respect for judicial precedent: civil and common law compared, texto inédito cedido pela autora. Cambridge, 2008, p. 43.

(61)V., por todos, MacCormick, Why cases have rationes and what these are, Precedent in law, obra coletiva ed. por Laurence Goldstein, cit., p. 162-163.

(62)Perelman e Olbrechts-Tyteca, Tratado da argumentação, cit., p. 122, que se referem a Aristóteles, em passagem alusiva a Isócrates (Sobre a troca, 173).

(63)Cf. MacCormick, The motivation of jugement in the common law, La motivation des décisions de justice, obra coletiva, Bruxelles, É. Bruylant, 1978, p. 183.

(64)Sartor, Precedente giudiziale, cit., p. 1.309.

(65)A respeito dessa distinção, v. Rupert Cross, Precedent in english law, 3. ed., Oxford, Clarendon, 1977, p. 80 s.; Francesco Galgano, L'interpretazione del precedente giudiziario, cit., p. 701 ss.; Gino Gorla, Precedente giudiziale, Enciclopedia giuridica treccani, 23(1990):10 ss.

(66)Cf. Ugo Mattei, Precedente giudiziario e stare decisis, Digesto delle discipline privatistiche: sezione civile, 4. ed., Torino, Utet, 2007, p. 155.

(67)Confira-se, a propósito, Moretti, La dottrina del precedente giudiziario nel sistema inglese, Contratto e impresa, cit., p. 689. Sobre o estilo dos pronunciamentos da House of Lords, que hoje é integrada por 12 Law Lords, v. Lord Wilberforce, La Chambre des Lords, La Cour Judiciaire Suprême: une enquête comparative, obra coletiva dir. por Pierre Bellet e André Tunc, Paris, Economica, 1978, p. 94-95; Cruz e Tucci, Direito processual civil inglês, Direito processual civil europeu contemporâneo (obra coletiva), São Paulo, Lex, 2010, p. 218 ss.

(68)Herbert L. A. Hart, O conceito de direito, 3. ed., Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 148.

(69)Edward D. Re, Stare decisis, Revista Jurídica, trad. port. Ellen Gracie Northfleet, Porto Alegre, 198(1994):30.

(70)Giovanni Sartor, Precedente giudiziale, cit., p. 1.343.

(71)Neil MacCormick, Legal reasoning and legal theory, ed. rev., Oxford, Clarendon, 1994, p. 215.

(72)MacCormick, Legal reasoning and legal theory, cit., p. 214.