JUSTIÇA

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segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Mesmo sob risco de vida, paciente não é obrigado a passar por cirurgia

Se o paciente se recusa ao ato cirúrgico, o Estado não pode invadir essa esfera e procedê-lo contra a sua vontade, mesmo que seja com o objetivo nobre de salvar sua vida. Com esse entendimento, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou recurso do Ministério Público (MP), que requeria autorização judicial para que fosse realizada a amputação do pé esquerdo necrosado de um idoso que se negou a passar pelo procedimento cirúrgico. O homem de 79 anos, ex-hanseríano, é morador do Hospital Colônia Itapuã, no município de Viamão, e alegou preferir morrer para aliviar o sofrimento.

Caso

Procurado pelo médico, o MP ingressou com pedido judicial para suprimento da vontade do idoso, que, conforme o autor da ação, está com anemia acentuada (consequência da lesão) e deve amputar o membro inferior, sob pena de morte por infecção generalizada.

O pedido foi indeferido em 1º Grau. O Juiz de Direito Giuliano Vieiro Giuliato entendeu que não se trata de doença recente e o paciente é pessoa capaz, tendo livre escolha para agir e, provavelmente, consciência das eventuais consequências, não cabendo ao Estado tal interferência.

Recurso

O MP recorreu da decisão, alegando que o homem não tem condições psíquicas de recusar o procedimento cirúrgico, porquanto apresenta um quadro depressivo, conforme os laudos médicos juntados aos autos. E justificou a urgência da amputação em reconhecimento à prevalência do direito à vida, conforme prevê a Constituição Federal.

No TJRS, o relator, Desembargador Irineu Mariani, destacou o resultado do laudo psiquiátrico do paciente, apontando que o mesmo continua lúcido, sem sinais de demência.

Na avaliação do magistrado, o caso em análise se insere no denominado Biodireito, na dimensão da ortotanásia, o que vem a ser a morte no seu devido tempo, sem prolongar a vida por meios artificiais. Resumindo, o direito à vida, garantido no art. 5º,caput, deve ser combinado com o princípio da dignidade da pessoa, previsto no art. 2º, III, ambos da CF. Isto é, vida com dignidade ou razoável qualidade. Em relação ao seu titular, o direito à vida não é absoluto. Noutras palavras, não existe a obrigação constitucional de viver.

O relator citou também a Resolução nº 1995/2012, do Conselho Federal de Medicina, na qual consta que não se justifica prolongar um sofrimento desnecessário, em detrimento à qualidade de vida do ser humano. E ainda destacou o art. 15 do Código Civil: Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Por fim, se por um lado muito louvável a preocupação da ilustre Promotora de Justiça que subscreve a inicial e o recurso, bem assim do profissional da medicina que assiste o autor, por outro não se pode desconsiderar o trauma da amputação, causando-lhe sofrimento moral, de sorte que a sua opção não é desmotivada, asseverou o Desembargador Mariani.

Acompanharam o voto do relator os Desembargadores Carlos Roberto Lofego Caníbal e Luiz Felipe Silveira Difini. A decisão é do dia 20/11/13.

Apelação Cível nº 70054988266


Fonte: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

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